Roma Bizâncio

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Virtudes Romanas - Rapto das Sabinas - Espártaco - 


VIRTUDES ROMANAS – MOS MAIORUM

Prof Eduardo Simões


__ O termo mos maiorum, em latim, cuja tradução literal seria “costumes dos antigos, dos ancestrais”, designa uma espécie de “código não escrito do qual os antigos romanos faziam derivar suas normas sociais. É o cerne do tradicionalismo romano, distinto, mas em dinâmica harmonia com as leis escritas. Os mos maiorum... eram princípios coletivos consagrados pelo tempo, modelos de comportamento e práticas sociais que afetavam a vida privada, política e militar da antiga Roma. Uma vez que a lei positiva [criada pelo Estado] regulava poucos aspectos da vida diária dos indivíduos, os costumes tradicionais, pela virtude da auctoritas maiorum (o prestígio dos ancestrais), moldavam boa parte do caráter romano” (Wikipedia em inglês – Mos maiorum), cujo principal núcleo de formação era a família.
__ Os mos maiorum constituíam também aquilo que nós costumamos chamar de “valores”, que eram sempre tomados como referência, quando se queria alertar sobre o perigo de certas inovações sociais ou costumes estrangeiros apressadamente assimilados, dessa forma eles serviam como um filtro que protegia a sociedade romana de mudanças muito bruscas, capazes de desestabiliza-la perigosamente. Esses mores (plural de “mos”) eram embasados em cinco virtudes básicas: a fides, a pieta, a majestas, a virtus, a gravitas

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Fides: cuja tradução poderia ser lealdade ou dever de veracidade, de ser crível. Desse mos surgiu o conceito de jurídico “boa-fé”, que se deve ter sempre em mente, quando se impetra ou sofre uma ação legal, uma vez que na antiga Roma a lisura dos contratos dependia de testemunhos orais. Fides era também o nome da deusa que presidia a assinatura de contratos entre os romanos e, detalhe curioso, ela é sempre apresentada como uma mulher jovem, embora na verdade seja muito antiga, na mitologia romana, anterior inclusive a Júpiter. Acreditava-se que essa deusa morasse na mão direita de cada homem, a mão com que ele fazia juramento, erguendo-a, e essa mão era representada nos estandartes das legiões, simbolizando a credibilidade que mereciam as legiões e o imperador. Estava também presente na saudação com o braço direito erguido, mostrando a palma da mão, símbolo que nazistas e fascistas, mentirosos contumazes, conspurcaram. O conceito de fides, atualmente, é melhor traduzido, em português, pelo de “credibilidade”, que lhe dá uma noção mais econômica e empresarial.   

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Pietas: que nós, de língua portuguesa, traduzimos com piedade ou devoção a Deus. Para os romanos também queria dizer devoção, aos deuses, é verdade, mas também à cidade, ao Estado, mesmo nas piores circunstâncias. “Era a atitude romana de respeito aos deuses, à sua terra natal, seus genitores, parentes, servos e escravos” (romanoimpero.com – I valori dela romanitá), e nesse sentido o seu melhor significado seria “respeito” e “proteção”, dados a quem delas precisa. Era também o cuidado que se devia ter com os ritos e cerimônias religiosas, cumpridas escrupulosamente, além de uma atitude também interior de respeito e devoção religiosa. Desse costume veio o hábito dos governantes romanos de elevar templos aos montes, ação de que muito se gabavam, inclusive em homenagearem outros homens, em geral pessoas a quem muito deviam.


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Majestas: era a dignidade e a força intrínseca que emanava do Estado em função mesmo de sua natureza popular, expressão da vontade política do povo, uma vez que, desde os primeiros anos da fundação de sua cidade, os cidadãos romanos participavam, por meio de assembleias, das decisões políticas. O Estado não era visto como algo fora da sociedade, imposto a esta, apenas para lhe cobrar impostos e devolver na forma de serviços precários e escândalos financeiros. Aliás, quando os imperadores romanos perderam essa dimensão original, e começaram a saquear o seu próprio povo, enquanto se isolavam em palácios magníficos, o povo romano parou de respeitar a majesta desse estado, e em pouco tempo ele desapareceu da história.

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Virtus: virtude. “Deriva do termo latino, ‘vir’, ‘homem’, e compreende aquilo que constituía o ideal do homem romano ideal. O poeta Gaio Lucillio sustenta que a virtus é a capacidade do homem saber o que é bom, mal, inútil, vergonhoso ou desonroso [evitando esses últimos]. Originalmente a virtus designava o valor do herói no campo de batalha, mas em seguida passou para todas as esferas de relacionamento” (idem). A virtus, que não deve ser posta a serviço de interesses pessoais, mas apenas para o bem da comunidade, era, na visão dos romanos, uma típica qualidade masculina que, por isso, era transmitida de pai para filho, e seus descendentes desse gênero, que ao reproduzir no presente os gestos heroicos que marcaram a vida de seus antepassados, mostravam-se possuidores da sua virtus.

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Gravitas: é uma espécie de “resumo da conduta romana tradicional: respeito à tradição,  seriedade [de conduta, dos modos sociais], dignidade, autoridade e autocontrole. Diante da diversidade, um “bom” romano deve ser imperturbável, como disse Mucio Sevola, enquanto era ameaçado de tortura pelo rei etrusco Porsena... na era imperial o significado esse conceito mudou para cortesia, gentileza, disponibilidade” (idem). Um de seus significados seria sobriedade, principalmente nos sentimentos, nos gestos e nas palavras. Um dos homens que mais cultivou a versão mais antiga desse conceito foi o poeta florentino Dante Alighieri, na Idade Média, que por isso é sempre retratado com um rosto impassível, concentrado. O melhor significado, hoje, em português, seria decoro.

As outras virtudes que marcaram o caráter romano, ao longo da história de sua cidade, foram:
Dignitas: é a virtude de quem tem uma situação econômica equilibrada, que lhe permite uma certa autonomia, não dependência, em relação aos outros cidadãos. Não esquecer que em Roma havia um tipo de gente, os clientes, em número considerável, que viviam ostensivamente da caridade pública e privada, em prol das quais cometiam os piores crimes.
Auctoritas: era a capacidade de um homem fazer-se prestigioso, reconhecido, no meio de seus pares; “uma das formas de conseguir isso era ajudando aos outros. Mais tarde esse termo ganhou o sentido de credibilidade, isto é: a capacidade de influenciar aos outros, principalmente no âmbito da oratória” (idem).
Gloria: “é a fama que se obtém após uma ação heroica no campo de batalha, e nesse sentido se encontra estreitamente vinculada à virtus, que não deve ser inferior à dos antepassados” (idem). Haveria uma competição entre os descendentes para reproduzir ou ampliar a virtus e a gloria dos antepassados
Urbanitas: urbanidade. “é o bom gosto e o espirito que naturalmente tornam um homem elegante e cortês... graças à influência grega, nasceram [entre os romanos] o refinamento, a cultura, a sutileza, a argumentação, o sofisma, o capricho” (idem). O contrário dessa virtude é a rusticitas: rusticidade, “que indica má educação, ignorância, falta de respeito e fineza” (idem).
Clementia: é o sentimento de moderação que, principalmente os soldados, se deve ter diante de um inimigo derrotado, ou mesmo no trato cotidiano entre um superior e um inferior hierárquico. Ela também pode ser definida como benevolência ou magnanimidade. “É o comportamento de um homem que, uma vez superado um grande stress, não se deixa dominar pela raiva, pelo desejo de vingança, mas age com benevolência” (idem). Um mestre nessa virtude foi o célebre general e ditador romano Júlio César, chegando a ponto de alguns afirmarem que ele a usava como um instrumento de cooptação e dominação, mas ao dizerem isso esses autores apenas confirmam o poderoso efeito natural dessa virtude, sem a diminuir em nada, nem a ela nem a quem a pratica.
Otium: ócio. “Originalmente dava a ideia de alguém a retirar-se de um negócio diário [negotium = sem ócio] ou de determinados assuntos, para poder participar de atividades que se consideravam valiosas ou ilustrativas, como o debate, a escrita de um livro ou a filosofia. Teve um significado especial entre diplomatas, filósofos e poetas” (Wikipedia em espanhol – Otium). Para o romano o ato de meditar a solução de um problema político, moral, ou escrever uma poesia era considerado otium. Na época imperial a elite agrária romana costumava retirar-se das cidades para suas “villa otium”, uma casa rural “dionisíaca, que evocava paz, sossego, simplicidade e serenidade” (idem). A agenda do político e diplomata romano, Plinio o Jovem, nos dá uma ideia de como era esse otium entre os abastados: ele “ditava cartas a seu secretário, lia discursos em grego, passeava pelos jardins da vila, comia e se socializava com os amigos, meditava, fazia exercício, se banhava [o banho para o romano da elite era um rito social importante], dormia a sesta e, de vez enquanto, caçava” (idem). Seria um pouco aquilo que nós chamamos de lazer, que os romanos aprenderam a valorizar e desfrutar com os gregos, e que não tinha o sentido pejorativo de hoje: malandragem. O otium romano era um lazer em sentido amplo, que também era apreciado pelos pobres, nas cidades, por meio dos jogos de gladiadores, corridas de cavalos, etc.
Simplicitas: simplicidade. No início era de uma maneira, desapegada, sem luxo, quase espartana, copiando o estilo de vida dos antigos: os romanos descendem de rústicos agricultores. No período imperial ela significava principalmente “comportamento espontâneo, mas sem cair no exagero do relaxamento, o que acarretaria o opróbio e o desprezo coletivo” (romanoimpero.com – idem).
Ambitiosa morte: morte por decoro. Acontecia quando o permanecer vivo acarretava ao indivíduo a perda de sua dignidade, desmoralização, ou algo de que o romano virtuoso não podia se desapegar, em virtude de um grande fracasso, de alguém ser pego com “boca na botija” ou simplesmente cair em desgraça ante um poderoso. Durante a revolta de Boudica, o comandante da 2ª legião, que, temendo uma derrota, recusou-se a se unir à XIVª e à XXª, ao saber da vitória destas sobre os bretões, percebendo que dali por diante sua recusa seria etiquetada de “covardia”, cravou a espada no seu peito. O escritor e político romano Petronius, sabendo que ia ser condenado à morte por Nero, preferiu chamar os amigos e, sentados numa mesa a comer e conversar sobre filosofia e amenidades, ordenou, num determinado momento, que um médico lhe abrisse os pulsos, para não dar ao imperador o gosto de tripudiar sobre ele.     
Aequitas: equidade. A virtude de tratar a todos por igual, principalmente perante a lei.
Constantia: constância. “O mesmo que ação perseverante, tenacidade, força de caráter, estabilidade no comportamento ético-moral” (idem). Os romanos tiveram a oportunidade de mostrar o quanto possuíam dessa virtude durante a Segunda Guerra Púnica, quando Aníbal esteve a ponto de tomar a cidade, mas os romanos não desistiram e continuaram firmes na sua meta, até virarem o jogo e vencerem a guerra.
__ Etc.

__ É evidente que nem todos os romanos praticaram essas virtudes, muito menos no grau em que idealmente foram construídas, havendo inclusive quem as tripudiou grosseira e publicamente de algumas delas, e tenha, inclusive, se dado bem por isso, principalmente no final do Império, mas essas virtudes, ensinadas nas famílias, por meio das histórias de seus ilustres antepassados, e nas escolas e praças públicas, sempre na forma de exemplos práticos e não de tediosas especulações filosóficas, como era na Grécia, ou como se diz hoje: de análise teórica, compunham uma indelével e poderosa memória pessoal e coletiva, que teve uma influência decisiva nos momentos críticos da Civilização Romana. Dito de outra maneira, a história, e acima de tudo a história, que é a memória coletiva de longo prazo, para traz, e de longo alcance, para frente, principalmente por meio do caráter mobilizador do mito, realidade necessária e transcendental a quem quer chegar a algum lugar, fundou, manteve e sustentou uma das mais extraordinárias civilizações do mundo, cujas marca lhe sobreviveram por milênios. Talvez haja uma lição aí para ser aprendida.

RAPTO DAS SABINAS (SÉC VIII A.C.)

Prof Eduardo Simões

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__ O quadro apresentado acima é um dos mais famosos do mundo, e um exemplo típico de uma corrente artística chamada neoclássica (segunda metade do século XVIII e início do século XIX). Ele se chama “A intervenção das sabinas”, e foi pintada pelo francês Jacques-Louis David, entre 1796-1799, e se refere a um dos mais famosos mitos sobre a origem de Roma, cheio de ensinamento, para quem não é preconceituoso ou estreito demais para só acreditar em “fatos”. A “história”, contada pelo historiador romano Tito Livio e o grego Plutarco é mais ou menos a seguinte:
__ Nos primeiros anos de Roma, quando ainda era governada por Rômulo, a cidade experimentou uma séria dificuldade. Situada num lugar estratégico, na confluência de várias rotas de passagem, a cidade era fartamente frequentada por comerciantes, aventureiros, fugitivos, etc., a maioria esmagadora do sexo masculino. Preocupado com o crescimento e afirmação de sua cidade frente às outras que a rodeavam, mais antigas e populosas, logo mais poderosas, Rômulo passou a dar acolhida a todo que quisesse morar em Roma, inclusive deserdados da sorte e escravos fugidos, ampliando consideravelmente a população masculina da cidade, para a preocupação de seus vizinhos, temerosos de seu poder crescente, em especial a dedicação dos romanos na batalha, uma vez que reconheciam a cidade que os acolheu, quando as outras os rejeitavam.
__ Logo se revelou o ponto fraco daquela aglomeração: a ausência de mulheres. Sem elas para constituir família e gerar filhos, a força de Roma estava com os dias contados. Rômulo enviou mensageiros com cartas aos grandes proprietários da vizinhança, em especial os do povo sabino, recém-chegados, muito agressivos e mais numerosos, pedindo para que eles concordassem em dar suas filhas em matrimônio aos romanos. Percebendo o ponto fraco da potência emergente, os patriarcas sabino aproveitaram para despedir os mensageiros de Rômulo, na verdade seus embaixadores, com galhofa e com a certeza que se dependesse deles não haveria casamento.
__ Diz Livio, que Rômulo ficou furioso e pensou até em atacar os sabinos e tomar as jovens à força, mas pesando melhor a proporção de forças e o ressentimento que fatalmente surgiria dessa atitude, ele preferiu apelar para um estratagema: convidou um grande número de patriarcas sabinos para, junto com a sua família, participar de uma alegre festa religiosa, num templo próximo às muralhas de Roma. Começou a festa, rolou muito vinho, com os romanos só se segurando, e quando pais, irmãos e parentes homens das moças já estavam bem grogues, os romanos saltaram sobre as jovens, deram uns sopapos nos poucos que tentaram resistir e levaram as solteiras para dentro das suas muralhas. Quando os sabinos presentes deram por si, o rapto já estava feito, as moças seguras, só lhes restou voltar para casa, a amaldiçoar aos romanos, jurando vingança.
__ O tempo passou, os pais ofendidos, buscaram parentes, fizeram alianças, juntaram armas e recursos para a guerra, e nisso passaram-se vários e vários meses, até que eles puderam se apresentar diante das muralhas de Roma, com um exército nunca antes enfrentado pelos romanos. A batalha foi duríssima, e os romanos, após uma resistência inicial, começaram a recuar, sentido a força dos atacantes, o desastre era inevitável. Foi nesse momento que as sabinas, percebendo que, ganhasse um lado ou ganhasse o outro, elas sairiam perdendo: ou perderiam os pais e irmãos (o amor parental), ou perderiam os maridos (o amor familiar), de quem já haviam aprendido a gostar. Saem então de suas casas e, algumas já com filhos, arrojam-se entre os dois exércitos, como que oferecendo-se à morte, forçando os contendores a parar.
__ Depois disso só restou aos brigões fazer uma aliança que redundou numa fusão entre romanos e sabinos, criando uma diarquia que durou cinco anos, com os sabinos vindo morar dentro de Roma, na área da colina do Capitólio.
__ Veremos a seguir uma sequência de três quadros do pintor germano-americano Charles Christan Nahl, pintados entre 1870 e 1871, muito interessantes pela recriação do momento psicológico dos personagens, que revelam que por trás dessa história havia um projeto de dominação imperial muito bem engendrado.

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__ No primeiro momento há o rapto, a violência, o confronto, que, no caso dessa história, só teve início quando o inimigo estava realmente sem condições de reagir a altura, reduzindo as perdas dos dois lados. Infelizmente, na ausência de um acordo satisfatório para as duas partes é necessário uma demonstração de força, que sempre causa sofrimento, angústia, principalmente no mais fraco, que é obrigado a ceder.

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__ O segundo momento é a hora da lábia, da conquista do consentimento do derrotado, da aceitação deste de sua derrota, de que ela, a derrota, não é necessariamente ruim para ele, que lhe pode trazer vantagens. É hora do mais forte fazer concessões, mostrar generosidade, ganhar o vencido para fazer dele um aliado de boa vontade. No caso das sabinas, Tito Lívio é claro: não houve estupro, abuso sexual ou qualquer forma de desrespeito contra as raptadas por parte dos romanos, seguindo-se então uma trabalhosa negociação. Hora de ambos os lados cederem.
__ Da parte dos romanos, Rômulo garantiu que só fizera aquilo movido pela recusa orgulhosa dos pais delas que, supostamente, levaram em conta mais os interesses políticos que a felicidade das filhas, e que a intenção dos romanos seria fazê-las esposas e mães de família, e não dar vazão a seu apetite sexual, sem falar que elas partilhariam de todos os direitos e herança de seus maridos, como se romanas fossem, e que os filhos dessa união seriam cidadãos de pleno direito.
__ As sabinas impuseram uma condição para concordar com o casamento: só seriam obrigadas a tecer as roupas da família, ficando o resto das tarefas domésticas para o maridão, as serviçais ou quando elas quisessem. As mulheres romanas ficaram famosas pela sua liberdade e autoridade dentro de casa e alhures. A matrona romana, na prática, embora não pela lei, que evoluiu mais devagar, lidava com os homens de igual para igual, e teve papel importante em muitos acontecimentos na república e no império.

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__ O povo dominado e assimilado agora faz propaganda das vantagens da aliança com Roma. O raptor, o marido, o romano, já não está sozinho para cooptar as boas graças do sogro rústico e furioso, que, ante o apelo da filha querida começa a amolecer o coração. A aliança é praticamente inevitável. E assim Roma, por meio dos seus aliados, ou com a ajuda deles, venceu muitas guerras e até evitou q  eu elas acontecessem, sem deixar de alcançar seu objetivo, ampliar o seu poder, como aconteceu, por exemplo, com a morte de Átalo III, rei de Pérgamo, uma importante e rica cidade da Ásia Menor. Esse rei, ao morrer, simplesmente doou seu reino a Roma, que o recebeu quase sem nenhum esforço ou guerra... Hora de colher os frutos.

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__ Tarpeia, ou a necessidade de ser claro. Ligado ao rapto das sabinas está o relato da virgem vestal Tarpeia, filha do comandante responsável pela defesa do monte Capitolino, Espurio Tarpeio. Diz a lenda que ela, seduzida pelos grossos braceletes de ouro que os guerreiros sabinos levavam no braço esquerdo, achegou-se ao rei sabino que atacava Roma, Tito Tacio, e revelou-lhe uma passagem secreta. Indagada sobre qual seria o seu preço, ela disse que queria aquilo que os sabinos levavam no braço esquerdo. Ora, além do bracelete os sabinos levavam também pesados escudos que, sob a ordem do rei, foram arremessados sem dó sobre a traidora, matando-a esmagada. Logo após o seu corpo foi arremessado de um esporão de rocha, com um grande precipício, que havia no monte Capitolino, que passou a chamar-se rocha Tarpeia, local de onde, durante a república, eram arremessados os condenados por crimes bárbaros, como se recusar a prestar testemunho, por dolo, ou traição. Neste caso o culpado era lançado da rocha por seus acusadores (Wikipedia em italiano).
__ Outra variante da história, querendo atenuar a culpa dela e melhorar a fama das vestais, diz que ela era filha de Tito Tacio, casada contra vontade com Rômulo, induzida pelo pai a cometer a traição – neste caso pegou mal para os sabinos, que já deviam estar suficientemente integrados a Roma para se doerem com isso. 

         

REVOLTA DE ESPÁRTACO (73-71 A.C.)

Prof Eduardo Simões

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__ Triste rotina dos prisioneiros de guerra dos romanos: ser levados aos mercados de escravos espalhados pelo império, torcendo para ser comprado por um senhor piedoso, e, principalmente escapar do trabalho nas minas, aonde a vida média de um escravo mal chegava aos sete anos. Foi justamente para uma delas, uma mina de gesso, que um ex-soldado romano, provável desertor, oriundo de tribos nômades da Trácia, no norte da Grécia, mas com um notável nível de cultura e capacidade de liderança – que faz alguns autores desconfiar que fosse filho de um nobre ou talvez de um rei local – chamado Spartacus, foi parar.
__ Por volta de 75 a.C. ele, que era famoso por seu condicionamento físico, foi descoberto por um lanista, um empresário de gladiadores, chamado Lêntulo Batiatus, e levado para a sua escola de gladiadores, em Cápua, na Itália.


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__ Em Cápua, ele começa um duro programa de treinamento, e logo se torna um dos melhores gladiadores – tornou-se um especialista em armamento pesado: o mirmilão, equipado com um vistoso capacete, um grande escudo e uma espada curta. Aí também conhece uma prostituta: Varínia, oferecida para o deleite dos gladiadores, e ambos se apaixonam. A possibilidade de sucesso e riqueza na carreira de gladiador e até a liberdade, no final, no final da carreira, não foram mais fortes que o seu desejo de liberdade imediata, nem forte o bastante para curar as cicatrizes da escravidão e dos maus tratos na escola. Em algum momento do ano 73, ele e mais setenta outros gladiadores, dos 200 que havia na escola se amotinam.
__ A cena acima é um fotograma do filme Spartacus, do diretor americano Stanley Kubrick, rodado em 1960, ganhador de 4 Oscar, uma das mais notáveis produções cinematográficas de todos os tempos. em destaque o ator Kirk Douglas, um astro na época, no papel de Spartacus. 
__ A sorte sorriu para os fugitivos. Logo encontraram uma carroça repleta de armas de gladiadores, com as quais derrotam a pequena guarnição da cidade, mandada em seu encalço, e se apoderam das armas e uniformes dos romanos. Em seguida eles fogem para esconderijos nas encostas do monte Vesúvio, um lugar de fácil defesa, de onde partem para pilhar as propriedades vizinhas, libertando um grande número de escravos que engrossam as suas fileiras.
__ Preocupados com o que acontecia em Cápua os romanos mandaram uma de milícia de 3 mil homens, comandados por Caio Claudio Glabro, que, menosprezando os escravos, não fortificou a sua posição, sendo atacado de surpresa, á noite, e completamente derrotado. Os soldados fugiram em pânico. Um segundo grupo de milicianos, uns 2 mil, foi mandado contra os escravos e também desbaratados, próximo ao Vesúvio. 
__ Daí, os escravos marcharam para o sul da Itália, até chegarem a Metapontum, no sul da península, e quando lá chegaram o seu exército já contava com dezenas de milhares de revoltosos, pois a eles se juntaram os escravos que eles foram libertando nas fazendas e cidades pelo caminho, além de pequenos camponeses arruinados ou insatisfeitos. Havia também descendentes de antigos povos dessa região, que ainda não haviam assimilado bem a dominação romana.


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__ Nesse momento, como era de esperar, começou a haver represálias por parte dos revoltosos, principalmente os ex-escravos, contra os senhores, em geral abastados proprietários rurais, que lhes caiam em mãos, generalizando-se o saque e outras violências.  Espártaco, mostrando um nível intelectual e preparação militar superior, além de uma rara visão estratégica, começou a organizar grupos de combate especializados, disciplinados, inclusive com esquadrões de cavalaria, para enfrentar a reação romana que, decerto viria. Nesse momento suas forças já atingiam uns 70 mil homens. 
__ Mais ou menos nesse momento ocorre uma dissensão entre os revoltosos, um grupo de uns 20 ou 30 mil revoltosos, se separou de Espártaco, para seguir sob o comando do gladiador gaulês Crixus – a provável causa da separação foi porque enquanto o primeiro queria levar os revoltosos para fora da Itália, o segundo queria continuar saqueando o país e até atacar Roma, embora haja também quem defenda que foi uma manobra planejada pelo próprio Espártaco, para dividir as forças romanas. Não sabemos ao certo. Seja como for, se foi manobra não deu certo. O grupo comandado por Crixus confrontou as legiões Lucio Gellius Publicola, e foi completamente esmagado, na batalha do monte Gargano (72 a.C.).
__ Ao saber da morte de Crixus, Espártaco mandou sacrificar 300 romanos, obrigando-os a lutar até a morte, como se fossem gladiadores, para em seguida derrotar, um após o outro, os exércitos dos cônsules Cornélio Lêntulo Clodiano, Lucio Gellius, e do procônsul Gaio Cassio Longino, aproximando-se da fronteira norte da Itália, em Mutina. Era só cruzar a Planície Padana e os Alpes e sair da Itália. Os rebeldes já eram uns 120 mil. Nesse momento também acontece algo estranho: Espártaco dá meia volta e retorna para o sul da Itália.
__ Espártaco, aparentemente, teve que se defrontar com um levante interno de um grande número de seus seguidores que, embriagados com as vitórias recentes, acreditavam poder encarar Roma de igual para igual, e quiçá conquistá-la. Espártaco cede, e ao fazer isso começa a perder o controle de sua gente, que deve ter passado a vê-lo como um chefe hesitante e, quiçá, medroso. Novamente, outro grupo de dezenas de milhares se separa do grosso da tropa e sofre o mesmo destino de Crixus.


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__ Para enfrentar o levante o Senado apelou para o controvertido aristocrata Marco Licinio Crasso, uma espécie de gênio nos negócios, sem qualquer escrúpulo ou regra moral, totalmente dedicado a aumentar o seu patrimônio, mas com alguma experiência no campo de batalha, com poderes absolutos – Crasso viu nesse momento a sua oportunidade de lançar-se numa promissora carreira política à custa do massacre dos escravos. A ele foram entregue oito legiões disponíveis, um total de 40 mil homens, de moral variado e ainda bastante abatidas pelas últimas derrotas. Na foto vemos a incrível ator inglês Sir Lawrence Olivier (sem capacete), como Crasso, no filme Spartacus, de 1960. 
__ Lançando-se com uma enorme gana nessa empreitada, Crasso começou por arrochar ainda mais a disciplina de suas legiões, inclusive trazendo de volta uma antiga forma de punição contra desertores e rebelados: a dizimação, já em desuso entre as legiões, tendo a oportunidade de usá-la quando, um de seus subcomandantes, Mummio, despachado para executar uma manobra de cerco, afoitamente centro do exército de Espártaco, sofrendo uma desastrosa derrota. Entre 50 e 400 sobreviventes foram mortos por dizimação.
__ O Senado reage mal à notícia, mandando o famoso general Pompeu, que voltava de uma guerra na Espanha, ir imediatamente para o sul da Itália, assumir a luta contra Espártaco. Crasso se desespera, pois Pompeu é o seu maior rival na pretensão ao poder máximo em Roma.

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__ Espártaco, então, dirige-se para a ponta da Bota Italiana, a Calábria, pretendendo passar para a Sicília, com a ajuda de barcos de piratas, que o traem, comprados pelos romanos. Crasso então o cerca ali, mas Espártaco usando de um estratagema – amarra tochas acesas em chifres de bois, à noite, simulando um ataque num ponto da trincheira romana, enquanto seus homens escapam por outro lado. Os romanos se recompõem rápido, quando Espártaco chega às margens do rio Silario se depara com as tropas de Crasso fechando-lhe a passagem. O confronto era inevitável. Acima um fotograma da espetacular batalha final entre Espártaco e Crasso no filme Spartacus, onde se pode ver o deslocamento sincronizado, em xadrez, das unidades das legiões – cada quadrado é uma coorte: uns 400 soldados, mais ou menos.
__ Sem alternativa, após o fracasso de suas tentativas em negociar um acordo com Crasso, segundo o historiador romano Apiano, e com o seu exército já fora de controle – pequenos grupos de revoltosos começaram a se desgarrar do exército principal tentando fugir ou atacar as legiões individualmente – Espártaco tenta um golpe ousado: junta seus melhores soldados e parte direto na direção de Crasso, para matá-lo e roubar as insígnias das legiões – se conseguisse isso teria um trunfo enorme – mas esse também era o setor mais bem guarnecido, e Espártaco desaparece no meio da furiosa batalha que se travou. Seu corpo jamais foi encontrado, nem se sabe que fim levou sua companheira, Varínia. Uns 25 mil rebeldes morreram nessa batalha, enquanto as baixas romanas, provavelmente pesadas, são desconhecidas.



__ As coisas não saíram exatamente como Crasso queria. Alguns escravos, uns cinco mil, fugindo para o norte, foram capturados e mortos por Pompeu, que requereu do Senado, e obteve, o reconhecimento de ter sido também responsável pelo esmagamento do levante. Restou a Crasso extravasar a sua frustração nos seis mil prisioneiros que lhe sobraram do Silário, fazendo-os crucificar ao longo da principal entrada de Roma, a vida Appia, de um lado e outro,
como um aviso a quem imaginasse a mesma aventura no futuro.


__ A revolta de Espártaco, também conhecida como Terceira Guerra Servil – as duas primeiras foram na Sicília – não foi uma derrota completa, longe disso. Os grandes proprietários rurais, impressionados com a extensão e a sanguinolência da revolta, começaram a reduzir o uso intensivo de escravos na agricultura, preferindo acordar com trabalhadores livres ou libertar os seus escravos para trabalhar permanentemente na condição de meeiro – dividindo a produção – a origem do futuro servo da gleba medieval, ao mesmo tempo em que houve alguns avanços na legislação que protegia os escravos de abusos. Claudio, imperador de 41 a 54, baixou uma lei que tratava a morte proposital de um escravo velho ou doente, fonte de despesas para seu senhor, como um assassinato, além de determinar que todo escravo abandonado por seu senhor se tornava, por esse fato, um homem livre. Há evidências de que o tratamento dado escravos na Península Italiana melhorou, após essa revolta.



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