terça-feira, 24 de julho de 2018

RUMO AO PRIMEIRO CENTENÁRIO

Prof Eduardo Simões

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__ Um dos traços mais obstinados da esquerda latino-americana é o da ojeriza, provavelmente herdada do primitivo receituário marxista, agravado por uma percepção maniqueísta da história, a tudo que se refira a “elite”, exceto, é claro, a que surge naturalmente no seio de suas próprias congregações. Nesse sentido pode-se dizer que uma de suas grandes metas políticas sempre foi o de gerar a fórceps as chamadas democracias “populares”, não tanto pelo fato de o povo determinar, ou pelo menos condicionar, as ações do estado, mas antes de se comportar docilmente às diretrizes do grupo de esquerda no poder.
__ A inutilidade, senão o prejuízo causado pelas elites não esquerdistas ao processo de amadurecimento político das nações americanas é por eles etiquetado como algo líquido e certo; mas será que esse julgamento se sustenta, pelo menos no caso da evolução da república brasileira, da qual dispomos de dados mais completos? A esse respeito vale a pena refletir sobre o que o economista e político liberal-monetarista, Roberto Campos, escreveu em sua biografia: “A lanterna na popa”:
No plano “político”, a administração pacífica dos conflitos – que é a essência da democracia – pressupõe consenso básico sobre as instituições [bem diferentes de petistas e corruptos de todos os matizes, mancomunados para encurralar o Judiciário e manietar a imprensa]. O que supõe, por sua vez, um certo grau de homogeneização cultural [ai de nós que descuramos da educação e dos estímulos à superação das desigualdades, muito além da mera igualdade de renda, como prega a esquerda]. No plano “econômico”, as necessidades de acumulação de capital exigem a contenção de pressões distributivas [impostas por grupos à revelia do mercado], que a democracia libera e às vezes açula. [Eugenio] Gudin costumava citar [Gunnar] Myrdal, segundo o qual “a história não registra um só exemplo de país onde se tenha atingido com sucesso a plena democracia de sufrágio universal, sem que primeiramente se tivesse conseguido um nível bastante elevado de padrão de vida e um alto grau de igualdade de oportunidade [só factível por meio de uma educação de qualidade e igual para todos]”... As duas grandes e mais antigas matrizes democráticas – Inglaterra e Estados Unidos – conduziram seu processo de industrialização sob a égide de “democracias elitistas”... esse países só atingiram a democracia de massa quando já haviam completado a sua modernização econômica e atingido o consumo de massa. E. Gudin costumava lembrar que na história brasileira o único período de normalidade democrática, de Prudente de Morais e Epitácio Pessoa, teve características de “democracia elitista”. A democracia se tornou instável precisamente quando buscava tornar-se mais “autêntica” pela incorporação [artificial e demagógica] das massas” (volume único; p 243-244).
__ li, certa vez, um escritor inglês, se gabar de que em seu país o voto só foi consentido ao povo depois de ele estar razoavelmente educado, e educação foi condição para o voto universal, e por isso, acreditava ele, o Inglaterra podia se gabar de estar já a trezentos anos sem um golpe de estado ou uma administração populista que torrasse impunemente as verbas públicas, o dinheiro de seu povo – bem diferente não?
__ Vejamos agora se a história nega ou confirma o aforismo de Roberto Campos e seu maior mentor, Eugênio Gudin, partindo do princípio que um dos principais sintomas de estabilidade em um regime republicano é a transmissão oficial do poder do governante ao seu sucessor; no caso do Brasil e transmissão da faixa presidencial:

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Primeira República (1889 a 1930)
Nesse período os únicos acontecimentos que tumultuaram a transmissão pacífica de poder foi a resistência do Congresso e a renúncia de Deodoro da Fonseca em 1891, além da morte de Afonso Pena, antes do fim do mandato, por pneumonia, em 1909, e a morte de Rodrigues Alves, antes de tomar posse, em 1919, devido a um câncer.

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Era Vargas (1930 a 1945)
1930 – Getúlio depõe, com um golpe que teve amplo apoio popular, o último presidente da Primeira República, Washington Luiz, logo não recebe deste a faixa.
1937 – Getúlio aplica um golpe no seu próprio governo e cria uma ditadura pessoal.
1945 – Golpe com golpe se paga; e Getúlio renuncia neste ano sob pressão do Exército; José Linhares, presidente do STF, assume interinamente.

http://memorialdademocracia.com.br/publico/image/5162
República Populista (1946-1964)
1946 – Dutra assume a presidência, sem receber a faixa do antecessor, que renunciara.
1951 – Getúlio e eleito pelo voto popular e recebe a faixa de antecessor.
1954 – À eminência de um golpe da Aeronáutica, Getúlio se suicida. Assume o vice Café Filho,
1955 – Café Filho adoece e se licencia, assume Carlos Luz, Presidente da Câmara, que começa a trabalhar no sentido de evitar a posse de Juscelino Kubitschek, sendo então deposto pelo exército. Nereu Ramos, do STF, assume interinamente.
1956 – Juscelino assume, sem receber a faixa do antecessor.
1961 – Jânio Quadros recebe a faixa de Juscelino e, em agosto, renuncia.
1961-1963 – Improvisa-se um parlamentarismo para driblar a resistência dos militares ao vice de Jânio, João Goulart; Goulart se torna presidente pleno em 1963.

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Regime Militar (1964-1985)
1964 – Os militares derrubam João Goulart; o primeiro presidente militar, Castelo Branco, não recebe a faixa do antecessor.
1967 – General Costa e Silva recebe a faixa do seu antecessor.
1969 – Um derrame acomete o presidente Costa e Silva, justo quando ele começava a contrariar os militares mais raivosos. Sedentos de sangue, poder e privilégios os três ministros militares dão um golpe e impedem que o vice, Pedro Aleixo, tome posse. As Forças Armadas impõem Garrastazu Medici na presidência, que assume sem receber a faixa do antecessor.
1974 – General Geisel assume a presidência e recebe a faixa do antecessor e a passará ao seu sucessor – o último presidente que recebera a faixa do antecessor e passara ao sucessor tinha sido Artur Bernardes, a mais de cinquenta anos (1922-1926)!
1979 – General Figueiredo recebe a faixa de Geisel.
1985 – General Figueiredo deixa Brasília, na surdina, para não entregar a faixa ao seu sucessor Tancredo Neves, eleito pelo Congresso. Tancredo adoece e morre, antes de tomar posse.

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Nova República (1985-  )
1985 – Sarney, vice de Tancredo, assume sem receber a faixa do antecessor,
1990 – Assume Collor de Mello, vitorioso em eleição direta, recebendo a faixa do antecessor.
1992 – Collor de Mello sofre impedimento, e é obrigado a renunciar. Assume o vice: Itamar Franco
1995 – Fernando Henrique assume e presidência sem receber a faixa do antecessor, que seria legalmente Collor de Mello, mas passará a faixa a Lula
2003 – Luis Inácio Lula da Silva recebe a faixa do antecessor e a passará ao seu sucessor, Dilma, 34 anos depois de Geisel, que recebera e transmitira a faixa normalmente.
2011- Assume Dilma Rousseff, que recebera a faixa de Lula.
2016 – Dilma Rousseff é impedida e assume o seu vice: Michel Temer; parece que vai começar tudo de novo!!

__ O próximo presidente, que iniciará o seu mandato em 1919, até 1922, assumirá sem receber a faixa presidencial de seu antecessor, e se considerarmos que todo esse processo de desordem política começou justo com a Revolução de 1930, veremos o quão exageradas e injustas podem ser as homenagens prestadas a Getúlio Vargas; que falta apenas 12 anos para completarmos um século de instabilidade política no Poder Federal; e que estamos no meio de uma crise política sem precedentes, com todas as mais altas instâncias decisórias do país completamente desmoralizadas, com o candidato mais “popular” na cadeia e o segundo colocado agindo como uma viúva do período mais violento e negativo da República; podemos então concluir que ainda estamos longe de “terra firme” e até que talvez o pior ainda está por vir...
__ Sem querer ser “desmancha prazer”, já sendo, seria bom lembrar que os acontecimentos mais trágicos, sangrentos e carregados de injustiças da história recente tiveram ampla e decisiva participação das massas, como que liderando o processo, embora fossem, na realidade, controladas por grupos de origem “popular” e oratória inflamada, a saber: a Revolução Francesa, a Revolução Russa, o Nazismo e o Fascismo, a Revolução Cultural na China e o governo do Kmer Vermelho no Camboja.

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Cena e 2011. Corremos, corremos, corremos, e estamos de onde começamos! O senador Randolfe Rodrigues e o deputado Chico Alencar seguram vassouras levadas ao Congresso pela ONG Rio de Paz e Movimento de Combate à Corrupção. 

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