A
MÃE DE TODAS AS BOMBAS VIVE COM O PAI DE TODOS OS ERROS
Prof
Eduardo Simões
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/e/e2/US_Navy_030210-N-3241H-105_USS_Carl_Vinson_Battle_Group_conducts_a_replenishment_at_sea_%28RAS%29_in_the_Western_Pacific_Ocean.jpg/800px-US_Navy_030210-N-3241H-105_USS_Carl_Vinson_Battle_Group_conducts_a_replenishment_at_sea_%28RAS%29_in_the_Western_Pacific_Ocean.jpg
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Trumpistas, sionistas, direitistas, racistas, etc. estão felizes, por motivos
diversos, com as últimas iniciativas de política externa tomadas por Donald
Trump – Gryzinski, de VEJA, trombeteia eufórica: “Melhor que a encomenda: Trump
está virando o jogo”. Diferente da política, a ideologia é uma questão de fé,
deixemos, pois, esta para os crentes de muita fé e pouco juízo e nos dediquemos
àquela, que, mesmo enquanto fruto da fé, sempre faz apelo à razão.
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Vejamos o que aconteceu nesses últimos dias. Ele deu um “cavalo de pau” no seu
discurso de campanha, em relação à Europa, e reconheceu que a OTAN não é mais “obsoleta”;
disse que a China não está mais adulterando a sua moeda, como foi habitual na
sua campanha, e se reuniu com Xin Ping em Washington; deflagrou um ataque
contra a Síria, movido por uma indignação pessoal com os ataques químicos do
governo, que combate o EI; ameaçou a Coreia do Norte e para lá enviou um grupo
de ataque da marinha (coincidentemente, poucos dias depois, o ensaio com um
míssil balístico coreano foi um fracasso); lança a mãe de todas as bombas no
Afeganistão, fazendo um estrago horrível numa base do EI; deteve os
assentamentos de Israel na Palestina, também contrariando seu discurso de
campanha. Nem Jim Carrey, possuído pelo Todo-poderoso,
seria capaz de mostrar tanta energia, embora nos fizesse rir e aprender, ao
final, virtude elevada, ao contrário desses acontecimentos.
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Creio que estamos diante de uma personalidade interessada antes de tudo em “causar”,
em aparecer, como é próprio do “espírito” das redes sociais, ainda que a custo
de grandes contradições, quebra de promessas e vidas humanas, sem falar de
furos e problemas que se criam a partir desse voluntarismo desvairado, a saber:
a Rússia, possível aliada no combate ao crescimento chinês, passa para o lado
oposto – sem que se vislumbre qualquer mudança na “questão asiática”, a saber:
como deter o expansionismo chinês que ameaça o seu similar americano? – e, de
quebra, promete armar o governo da Síria com armas mais sofisticadas. Ou seja:
a paz, agora, ficou mais distante. Enquanto isso a Turquia, fora do campo de visão
americano, ensaia o retorno ao sultanato, com um matiz republicano, que não
engana nem aos turcos. Ela ficará permanentemente no limbo? Claro que não, mas
se pular para o lado dos russos os europeus estarão encrencados, e os russos muito
bem posicionados para intervir no Oriente Médio.
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Essas intervenções recentes vão justo na direção oposta às promessas de
campanha que apontavam ao retorno do isolamento, que fez a prosperidade da
América nos anos 1920-30, e apontam para mais engajamentos armados, dos quais,
a sociedade americana já sinalizou fartamente estar saturada, só que com uma
característica nova, tipicamente trumpiana: não há qualquer direcionamento
perceptível. As relações internacionais se tornaram completamente
imprevisíveis.
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Já que os trumpistas gostam tanto de falar em “jogo”, permaneçamos no campo dessa
metáfora. Suponhamos um jogo de xadrez. Trump mexe muitas pedras
aleatoriamente, tentando sanar problemas de curto prazo, sem pensar nas jogadas
seguintes. Quais são as possibilidades de sucesso? Mas o xadrez é um jogo
complexo e sofisticado demais para um homem como Trump e a melhor metáfora
talvez seja a do cassino em Las Vegas ou, melhor, do saloon, do Faroeste, onde
o cowboy entra chutando a porta, e vai, sedento, se ajuntar aos jogadores,
disputando ao mesmo tempo várias partidas em várias modalidades diferentes.
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Trump parece agir como se acreditasse que só ele sabe blefar, que se jogar os
dados dessa ou daquela maneira conseguirá esse ou aquele resultado, que se seus
parceiros de pôquer fizerem esse ou aquele gesto, por menor que seja, estarão
comunicando essa ou aquela emoção, e que as regras do acaso ou das
probabilidades de maneira alguma interferem nos resultados de suas decisões,
por conseguinte, ele tem controle absoluto sobre tudo. Para ele, ao que parece,
os homens são perfeitamente racionais e previsíveis, como afirmam os gurus do
behaviorismo americano, e a tal estímulo se obterá sempre a mesma resposta.
Quais são as chances reais de isso dar certo? Parafraseando Piaget, eu diria
que Trump parece um operatório concreto, com uma importante decalage no plano
emocional...
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Resta ainda uma questão: o que estará por trás dessas mudanças tão surpreendentes
de direção: ele nunca falou a verdade, mas apenas aquilo que interessava ao
eleitor naquele momento? Encontrou nos membros do Partido Republicano mais
resistência do que esperava (os republicanos simularam ódio muito intenso às políticas
sociais, intervencionistas, de Barack Obama, mas parece que a causa desse ódio
era de outra natureza, e só agora se manifestou)? As instituições americanas, com
raízes seculares, em todos os escalões, estão podando os galhos mais
proeminentes do arbusto trompista? A simulação tem nele caráter de uma
estratégia compulsiva para confundir os adversários, que nem ele mesmo sabe bem
quem são ne, onde quer chegar?
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Trump mexe em muita coisa ao mesmo tempo, e o faz de maneira desconexa, aparentemente
sem um plano de longo prazo, como a sanar estresses episódicos. As chances de
isso dar certo são quase nulas, já de dar errado... Ele não está virando o
jogo, está virando a mesa, pode ser que os outros jogadores não gostem e
resolvam sacar suas armas, como era vulgar no Faroeste.
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A situação pode, inclusive, se complicar antes mesmo de começarem os grandes
lances, pois ao dar um chute nas portas do saloon, o cowboy, ignorando o
detalhe das molas nas dobradiças, corre o risco de recebê-las violentamente de
volta, pelos dois lados, causando-lhe uma grande dor de cabeça.
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