quarta-feira, 5 de outubro de 2016


A CAMPANHA DE GERMÂNICO (14-16) OS LIMITES DO IMPÉRIO

Prof Eduardo Simões

O cenário das operações

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Di Cristiano64 - Opera propria, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=11141282

__ Vemos no mapa a fronteira dos domínios romanos ao longo do rio Reno, durante as operações de contenção levadas a efeito por Tiberio (setas vermelhas), após o massacre de Teutoburgo. No conjunto temos:
a) As porções verde escuras mostram os povos germânicos aliados aos romanos: no norte, junto à foz do Reno, temos: os frísios, os batavos, caninefates e camavos; ao centro temos; um pouco abaixo os sicâmbrios e os têncteros, e mais abaixo, numa cunha feita pelo curso do rio, temos: os vangiões, os nêmetes e os tribocos.
b) Em amarelo os grupos independentes, mas clientes de Roma: no norte, junto à foz do rio Elba temos: os casuaros, os amsivaros e os caúcos; ao sul, na área maior, os ermunduros, marcomanos, naristos e quados.
c) Em róseo temos a área de domínio dos povos que ofereciam resistência à dominação romana: angrivaros, brúcteros, queruscos, usípetes, marsos, catos, matiacos.

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__ Entre 11 e 13, as regiões à margem direita do Reno assistiram às tépidas operações militares de Tibério César, mais no sentido de fortalecer a aliança com os povos aliados, procurando conter uma explosão de revoltas na fronteira, que punir a afronta sofrida em Teutoburgo, não só pela falta de recursos, mas também porque os olhos e a preocupação maior de Tibério estava a milhares de quilômetros dali, em Roma, onde dava sinais de fim próximo o seu pai adotivo, o príncipe-imperador Otaviano Augusto, e começava a se desenhar uma luta pela sua sucessão, que Tibério não queria ficar de fora. Deve ter sido com certo alívio quando ele, afinal, deu por encerrada a sua participação e voltou para Roma, em outubro de 12, para celebrar as suas vitórias na Panônia (partes da Hungria, Áustria, Croácia, Eslovênia), deixando o teatro de operações nas mãos de um general jovem e competente: Germânico Julio César (abaixo), filho de outro general que, trinta anos antes, havia feito muito estrago entre as tribos germânicas: Nero Claudio Druso Germânico.

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By Self-photographed — PierreSelim (taken in 26 october 2012), CC0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=25609528

__ Para Tibério, assimilando a doutrina de Otaviano, a fronteira ideal para o império na região seriam as terras à margen esquerda  Reno, também chamada de Germânia Inferior, isoalda pelo rio dos  povos da Germania Magna, terras entre o Reno e o Elba, por uma série de fortins e paliçadas, nos pontos em que o Reno era mais delgado, ao mesmo tempo em que estava convencido de que não haver, para lá do Reno, riquezas que compensassem os custos de operações militares contra os povos locais. Era melhor esquecer o incidente em Teutoburgo. Entretanto não era assim que pensava Germânico Julio Cesar (acima), que aproveitou a ausência do seu superior e rival político para acumular recursos e conseguir patrocinadores para punir exemplarmente os autores da emboscada às legiões de Varo e recuperar as águias das legiões massacradas. Para isso ele dispunha de oito legiões: a XXI Rapax, a V Alaudae, a I Germanica, a XX Valeria Victrix, a II Augusta, a XIII Gemina, a XIV Gemina e a XVI Galica. Uma emboscada em tempo de paz é só uma emboscada em tempo de paz; Roma agora iria mostrar como é que se faz uma guerra de verdade! Esse era o espirito que o animava.
__ Havia entretanto um problema, com a morte de Augusto os veteranos das legiões mais antigas se revoltaram, afinal eles vinham de 20 anos de campanhas duríssimas, e achavam que já haviam adquirido algum direito à reforma e a um aumento substancial de soldo. Germânico agiu com presteza e satisfez todas as reivindicações dos legionários, e ainda presenteou-os com um soldo que era o dobro do que pediram, após o que recebeu o juramento de lealdade das tropas, e partiu para a sua campanha.

Início das operações (ano 14)
__ A primeira medida foi devolver a emboscada a Varo com outra, dirigida aos marsos, aliados de Armínio. No ano de 14 ele construiu uma ponte e atravessou o Reno com 4 legiões (12 mil soldados), 26 coortes de infantaria auxiliar e 8 alas de cavalaria, para cobrir os flancos das tropas. Suas tropas avançaram até os restos de uma velha fortaleza, na floresta de Cesia, atual cidade Delbrück. A data escolhida para o início das operações fora cuidadosamente pensada. Era dia de uma importante festa religiosa dos germânicos, que, como era de praxe nessas ocasiões, os homens bebiam até não poder mais, ficando logo imprestáveis.

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__ As legiões foram espalhadas em quatro colunas diferentes, para abarcarem uma grande extensão de terreno e fazer o maior estrago possível, num arco de umas 50 milhas, aproveitando-se que era uma noite de lua cheia, e seria mais fácil divisar os alvos, podendo caminhar pela floresta sem luz artificial. A ordem era uma: todos germânico que estiver ao alcance de uma arma romana, independente de idade e sexo, deve ser abatido imediatamente. Não haveria prisioneiros. Os legionários, ao sinal combinado, como máquinas, caíram ao mesmo tempo sobre várias aldeias e foram matando, sistematicamente, todos que lhes caiam nas mãos. Mulheres e crianças, as que conseguem, correm para as matas gritando e chorando frenéticas. As que tentam resistir morrem com os homens, estes sem nem o saber, após o que as aldeias são queimadas junto com os corpos, inclusive o templo de uma deusa, muito cultuada por esse povo.
__ Aldeias próximas de brúcteros, tubantes e usípetes, são alarmadas pela gritaria e o clamor difuso que se alevantavam das aldeias marsas, e acorreram em armas para atacar os romanos, alcançando-lhes a retaguarda, onde estava a XX. Os romanos, já preparados para isso e comandados pessoalmente por Germânico, conseguiram rechaçar o ataque, voltando em seguida para os seus quarteis de inverno.
__ Assim acabou o ano 14

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Novos confrontos
__ No ano seguinte, 15, partiu uma nova expedição romana, dessa vez com as tropas divididas em duas colunas: uma, comandada por Aulo Cecina Severo, sairia da fortaleza de Castra Vetera, com 4 legiões (12 a 15 mil homens), 5 mil auxiliares, mas algumas tropas de aliados germânicos da margem esquerda do Reno; outra sob o comando de Germâncio, sairia de Mogontiacum (atual Mainz), com 4 legiões, e o dobro de aliados germânicos. Germânico fez seu ponto de apoio nas ruínas de uma fortaleza em Monte Tauno (norte da atual Frankfurt).
__ Germânico avança rápido no coração do território dos calcos e vai exterminando a todos que encontra pela frente. Quem tentou se opor pereceu enquanto muitos jovens e adolescente, fugindo daquele rolo compressor,  se atiram no rio Adrana (atual Eder) e se afogam. A capital dos catos, Mattium (atual Niedenstein), é tomada e meticulosamente saqueada e incendiada. Depois ele volta calmamente para o Reno. Ninguém ousou enfrentá-lo.

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__ Mais ao norte Aulo Cecina consegue conter os grupos de queruscos que tentam ajudar aos catos. Os marsos se arriscam a uma confronto direto com ele, mas são derrotados.
__ Germânico chegara a uma fortaleza na margem romana do Reno quando foi avisado, por uma embaixada do querusco aliado de Roma, Segeste, sogro de Armínio contra a vontade, de que naquela hora se achava cercado pelos queruscos partidários do chefe rebelde e precisava de ajuda romana. Germânico partiu prontamente e conseguiu levantar o cerco contra o aliado que, ao final, lhe entregou um presente inesperado: a sua própria filha, Thusnelda, que tanto desgosto lhe causara. Ela encarou o pai com dureza e queixo erguida, enquanto este, sem dizer nada, deu-lhe as costas.

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Di Karl Theodor von Piloty - Web Gallery of Art:   Image  Info about artwork, Pubblico dominio, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=15499896

__ Thusnelda, que era a esposa preferida de Armínio e estava grávida de um filho deste, foi levada a Roma e obrigada pelas ruas da cidade no triunfo de Germânico, no ano 17, estando entre os presentes o seu antigo pai... Algum tempo depois de capturada ela dará a luz a um filho de Arminio, chamado Tumélico, que, supõe-se, foi entregue a uma escola de gladiadores, e, segundo os dados disponíveis, teria morrido antes dos 20 anos. E ela? Provavelmente foi feita escrava e vendida para algum ricaço romano. Após o desfile a história silencia a seu respeito. Nada mais sabemos... A imagem acima, feita por um pintor alemão do século XIX, Carl Theodor von Piloty, mostra os prisioneiros germânicos desfilando diante do imperador. Os germânicos, embora vencidos, são belos, vistosos e estão na luz, enquanto os romanos são apresentado de modo caricato, como os soldados em primeiro plano, ou estão nas sombras, afinal para os alemães Armínio e os seus podem ser considerados os fundadores da nacionalidade alemã. O pai de Thusnelda está na imagem, de pé, ao lado de Tibério, com a cabeça baixa, sabe lá se com vergonha da filha ou de si mesmo... É uma obra de arte politicamente muito engajada.
__ Armínio, é claro, não ficou imóvel e começou a articular, junto com os chefes de outros povos, uma grande sublevação contra o invasor, ao mesmo tempo em que, alertado desses preparativos, Germânico preparou outra campanha ainda para aquele ano, da seguinte maneira:
a) Aulo Cecina, com 40 coortes (20 mil soldados, incluindo auxiliares), invadiu o território dos brúcteros, em direção ao rio Amisa (atual Sem).
b) o prefeito Pedone conduziu as unidades de cavalaria, pelo país dos frísios, em direção ao mesmo rio.
c) Germânico seguiu com 4 legiões (20 mil homens) embarcadas, seguindo o trajeto do rio, para se encontrar com os outros dois no estuário do Amisa, talvez na atual Bentumersiel (Baixa Saxônia).

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__ Após a reunião dessa forças ele determinou a um oficial Lucio Estertinio a seguir com a infantaria e cavalaria ligeira pelas terras dos brúcteros, arrasando sistematicamente tudo à sua frente. Essa ação, entretanto, teve um resultado inesperado: foi encontrada a águia da legião XIX, exterminada em Teutoburgo. Após ter exterminado todos os inimigos ao longo de um vasto território, Germânico avançou bem no coração da Germania Magna e se dirigiu até Teutoburgo, para prestar honras aos legionários que morreram. À frente marchava Aulo Ceccina e suas tropas, preparando o terreno para o grosso do exército que seguia atrás, por meio de pontes, rampas e aterros, até que o grosso do exército penetrou em densas florestas, envolvido por uma paisagem macabra (acima), até que chegaram ao lugar fatídico:
Pelo chão, espalhavam-se pilhas de ossos embraquiçados ao tempo... por todo o entorno... fragmentos de armas e carcaças de cavalo. Viam-se crânios presos aos galhos das árvores. Nos bosques sagrados das proximidades foram vistos altares onde os germânicos sacrificaram oficias de alta patente, tribunos e centuriões. Sobreviventes da batalha, que haviam escapado à prisão, apontaram o lugar onde haviam visto cair mortos os legados [oficias superiores], e onde haviam sido arrebatadas as Águias, e mostraram onde Varo recebera a sua primeiro ferimento, e onde se bateu até a morte, cometendo ao final o suicídio. Mostraram uma elevação, onde Armínio teria falado aos seus, e as numerosas forcas preparadas para os prisioneiros, e a arrogância e o desprezo com que Armínio havia mandado sepultar, numa vala comum, as insígnias e a Aguia imperial [cada legião levava vários sinais de identificação: bandeirolas, esculturas, etc., cuja preservação era ponto de honra]” (trecho de Anais de Cornelio Tacito, traduzido de Spedizione germanica di Germanico – Wikipedia em italiano).

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__ Nesse momento é detectada a presença de Armínio nas redondezas e vários esquadrões de cavalaria foram mandados para persegui-lo, Arminio, fingindo fuga, atraiu-os para um lugar de densa vegetação, e fez cair sobre eles uma emboscada, que começou a causar pânico entre os cavaleiros. Nesse momento chega a infantaria ligeira para dar suporte à cavalaria, mas só aumenta a confusão. Germânico faz então avançar ordenadamente as legiões que tinha, equilibrando o combate, forçando a retirada dos germânicos.
__ Após o confronto, Aulo Cecina, à frente de 40 coortes, tomou um itinerário conhecido como das Pontes Longas, que, através da floresta, cruzavam uma zona de pântanos, e haviam sido construídas pelo cônsul Lucio Enobarbo, uns 18 anos antes, numa das intermináveis campanhas dos romanos na Germânia. Entretanto, ao chegar lá percebeu que as ditas pontes tinham sido destruídas, por isso fez alto e começou o trabalho de reconstruí-las com seus soldados, não sem antes escolher um local seco e elevado, onde mandou construir uma acampamento com todos os cuidados e recursos de segurança comuns aos acampamentos romanos. Os romanos estavam nesses trabalhos quando os germânicos atacaram em massa as tropas que estavam a refazer a ponte de madeira sobre o pântano.

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__ O choque foi tremendo, e mais uma vez os romanos estavam em desvantagem, lutando com o seu equipamento pesado em um solo muito mulhado e escorregadio, que atrapalhava, inclusive, no arremesso das lanças da infantaria, enquanto os alemães, mais leves a acostumados ao terreno, lançavam as suas com grande precisão causando muitas baixas. Para a sorte dos romanos a noite desceu, e os germânicos cessaram o seu ataque, embora estes continuassem dentro da mata, em grande algazarra. Aulo Cecina então organizou taticamente as suas legiões a V Alaudae à esquerda a XXI Rapax à direita, a I Germania ao centro e a XX Valeria Victrix na retaguarda, criando um anel de proteção em torno das tropas atacadas, restabelecendo um pouco do moral da tropa.
__ Aquela noite no pântano foi pavorosa, para os romanos, que ouviam os cantos e as vozes festivas dos germânicos ecoando pela mata, já comemorando a derrota dos invasores. Diz o historiador Tácito, que, insone, Aulo Ceccina teria visto visto o espectro de Varo sair da lama do pântano, todo ensanguentado e coberto de musgos, estendo-lhe a mão como a dizer-lhe: “vem comigo”, mas aquele recusou-a. Quarenta anos de serviço deram a Ceccina a calma e o sangue frio para não entrar em pânico. E bem que havia motivos para pânico: à noite, procurando, se instalar em terra seca, a V e a XXI deixaram as suas posições, sem comunicar nada a Cecina, deixando as tropas auxiliares e a bagagem expostas ao ataque. Arminio não desprezou a oportunidade.
__ De manhã, enquanto uma névoa se dissipava, ouviu-se um brado em um latim, saído da floresta: “Aqui Varo e suas legiões enfrentaram o mesmo destino, presos por um laço”, ao mesmo tempo em que, gritando loucamente, milhares de germâncios com sua grande estatura e aspecto selvagem saem da mata e se atiram sobre as exaustas tropas auxiliares que forcejavam com a bagagem. A tropa começa a mostrar sinais de pânico. Cecina atordoado e a se perguntar “como eles passaram pela V e a XXI?”   Cavalga então com pressa para a frente, a fim de organizar a defesa, mas logo que chega seu cavalo é atingido por uma flecha na barriga e cai, arrastando consigo o cavaleiro. Os germânicos se animam mais ainda e avançam na direção de Cecina. Nesse momento a I Germania, que estava à frente, ouvindo o baraluho do combate, voltou, e carregou sobre os germânicos com grande impacto, obrigando-os a recuar, depois de muita luta, salvando na última hora o dia e o seu comandante.
__ Os romanos então se posicionam num lugar mais elevado e seco e procuram montar um acampamento defensivo improvisado, com grande sacrifício pois boa parte das ferramentas se perdera junto com os muitos vagões de bagagem na batalha. Foi outra noite de vigília e preocupação, mas a tropa permaneceu coesa, enquanto mensageiros foram mandados para contatar as outras legiões.

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__ No dia seguinte os germânicos atiraram com toda gana contra o acampamento romano, para o ou tudo ou nada. A I e as tropas auxiliares aguentaram bem o tranco, enquanto os germânicos se amontoavam cada vez mais junto a eles, tentando com empurrões forçar as tropas romanas a se desagregarem e dispersarem. Quando Cecina sentiu que a sua concentração atingira o auge, deu ordem para os músicos tocarem na cornu (uma enorme trombeta) um sinal convencional. Nesse momento duas muralhas de escudos formadas pela V e a XXI apareceram nos dois lados dos atacantes. De dentro dessas muralhas, lanças romanas, uma maravilha de engenharia militar (penetra o corpo com facilidade, mas dificilmente fica presa aos ossos), se projetam e recuam, e vão perfurando o que estiver à frente. A fileira de trás empurra a da frente, e ai de quem cair! Os legionários tentam firmar os pés sobre os corpos dos germânicos caídos, pisando-os com força, quebrando ossos, é uma máquina, uma morsa com dois mordentes se fechando. Os germânicos tentam resistir, em vão, Arminio teve que abandonar a batalha bastante ferido, assim como o seu tio Inguiomero, outro líder dos revoltosos. Seguiu-se um massacre horripilante, após o qual os romanos, após uma grande comemoração, seguiram o seu caminho para invernar na margem ocidental do Reno, onde encontraram todos em polvorosa, pois a notícia de seu cerco chegara, junto com o boato de que os germânicos iriam, por isso, invadir as Gálias, e muitos já falavam em derrubar a ponte sobre o rio, impedida na última hora pela intervenção pessoal de Agripina, a esposa de Germânico.  
__ Mais ao norte, porém, aconteceu uma tragédia. A coluna de Públio Vitelio, formada pelas legiões II Augusta e XIV Germania, teve que se retirar por terra, pelas terras baixas do norte, na atual Holanda, e justo quando passavam por essa parte do terreno sobreveio uma tempestade incomum, e a maré avançou sobre as praias, engolindo uma grande quantidade de soldados, animais e bagagem. A maior parte das legiões, entretanto se salvou, amontoada em desordem, sobre um banco de areia mais elevado, até que no dia seguinte foi salva por uma forta trazida por Germânico, pelo Mar do Norte.

As operações no ano 16
__ Após dedicar um longo tempo, junto com seus oficiais, ao estudo das lições tiradas dos dois primeiros anos de guerra Germânico chegou às seguintes conclusões:
a) Embora vulneráveis em áreas abertas, os germânicos eram muito difíceis de serem derrotados dentro de suas florestas e pântanos, além de serem favorecidos pelo inverno precoce e longo em seu país.
b) Ao se deslocarem pelas florestas, em caminhos inadequadas, os romanos eram obrigados a estender suas linhas, o que os deixava sujeitos a constantes contra-ataques e ações de guerrilha, sem falar que os soldados chegavam às batalhas já esgotados pela caminhada e o peso da bagagem.
c) Os auxiliares gauleses estavam perto do esgotamento quanto à sua capacidade de fornecer comida e armas aos legionários.

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__ A solução encontrada foi embarcar a maior parte dos suprimentos e das máquinas de guerra em navios, além de soldados. Para isso foram despachados engenheiros e construtores navais para reforçar a chamada Classis Germanica, que era o nome da frota de barcos romanos que fazia a vigilância no Mar do Norte e nos rio da região, criada por Augusto. Seria uma grande operação anfíbia, cuja viabilidade demandou adaptações tecnológicas nos barcos: popa e proa estreitas, mas bojo largo, para dar-lhe mais estabilidade nas águas revoltas do Mar do Norte; quilha aplainada para reduzir o calado, e, consequentemente, as possibilidades de encalhar; encaixes para o leme na proa e na popa, permitindo que o navio fizesse rapidamente a marcha a ré, etc. No início das operações Germânico tinha à sua disposição cerca de 1.000 barcaças.
__ Seguindo pela margem ocidental do Amisia (Ems), Germânico desembarcou à altura de Kalkriese-Teutoburgo, e mandou um legado com tropas auxiliares devastar a terra dos catos, enquanto ele se dirigia ao forte de Aliso (atual Haltern), para liberá-lo de um cerco, com oito legiões. Os germânicos fugiram ante a notícia de sua aproximação, e ele avançou para Teutoburgo, onde constatou que o monumento a Varo e seus companheiros fora destruído. Reconstruiu-o e, abastecido pela frota, continuou a marcha, não sem antes destacar um comandante, Stertino, com tropas auxiliares, para devastar as terras dos angrivaros, autores do sacrilégio, e avançou em marcha forçada para o leste, na direção do rio Visurgis (atual Weser). Lá chegando, encontrou afinal o que esperava: Armínio e seus queruscos, do outro lado do rio. Os dois exércitos miraram-se com ódio recíproco.
__ Nesse momento ocorre um fato inusitado, segundo o historiador Tácito: Armínio indaga se um seu irmão, de nome Flavio, encontra-se entre os legionários, ao receber resposta afirmativa, pede para lhe falar. Os romanos consentem. Os dois irmãos se encontram entre os dois exércitos e, após um cumprimento constrangido, tentam convencer-se mutuamente: Flávio pede para Armínio que abrace a causa de Roma e se submeta, Armínio, ao contrário, pede ao irmão que permaneça fiel às antigas tradições de seu povo. Como nenhum consegue convencer o outro, o diálogo vai ficando mais áspero e ambos começam a insultar-se, mais um pouco e eles se atracavam ali mesmo. Estertino, que fora junto com Flavio, intervém, e os contendores se afastam cheios de mágoas e ressentimentos, sem aperceberem-se que não passam de peões no jogo da história e do mundo real, que os envolvem, e de que eles não são capazes de abarcar em toda magnitude, alguém poderá?, e destrói, sem dó, os mais nobres e fraternos sentimentos!

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__  O exército de Germânico compunhá-se de 1.000 pretorianos, 24.000 legionários (8 legiões), 20.000 soldados auxiliares (40 coortes), 4.000 cavaleiros (divididos em 8 alas), 800 arqueiros montados e 5.000 germânicos aliados (batavos, ubis, caucos, frísios, etc), o de Armínio tinha um número equivalente, embora não tão especializados. No primeiro momento a cavalaria batava cruzou o rio e, percebendo a retirada da cavalaria querusca, açodou-se em persegui-la, caindo numa armadilha, e logo adiante foi envolvida pelos queruscos. O rei dos batavos, Cariovaldo, e muitos chefes caem mortos, e o restante só escapa pela intervenção da cavalaria pesada romana de Estertino (acima).
__ Nesse momento, Germânico, que cruzara o rio, soube por um desertor, do lugar escolhido por Armínio para a batalha. Os romanos montam logo um acampamento, que sofre um inopinado ataque dos germânicos, a custo repelido.
__ Na manhã seguinte os romanos foram ao encontro dos germânicos e os encontraram alinhados numa planície, cercada por uma vegetação densa e... suspeita. Os romanos estavam tão ressabiados que Germânico dispôs suas tropas de uma forma estritamente simétrica, um tanto defensiva, por precaução contra qualquer ataque inesperado pelos flancos, bem como tentou balancear ao máximo as tropas que dispunha, de acordo com o poder e a capacidade de combate de cada uma. A batalha começou com a arremetida violenta dos germânicos contra a primeira linha da infantaria auxiliar, que cedeu e recuou, sendo escorada pela segunda linha, mais poderosa, formada por legionários. A cavalaria germânica, com Armínio à frente, sai de surpresa de uma floresta e tenta golpear o flanco direito dos romanos, mas é detida pela cavalaria pesada dos romana, enquanto pelo outro lado, esquadrões de cavalria sob o comando de Estertinio, vendo o caminho livre, entram pela floresta no intuito de pegar a infantaria germânica pela retaguarda.
__ Num determinado momento Germânico ordenou o avanço de suas legiões, justo no momento em que a cavalaria romana, devidamente posicionada, lançou-se contra multidões de germânicos escondidos na mata (acima). Aconteceu então uma barafunda total entre estes: os que enfrentavam os romanos na planície, impactados pelo choque com as legiões, fugiram para a floresta, enquanto aqueles que etavam ocultos na floresta correram para a planície, tocadas pela cavalaria de Estertinio. Imaginem as duas massas se esbarrando, em meio a uma chuva de lanças, flechas e pedras arremessadas por legionários, arqueiros e os fundibulários das legiões.
__ Armínio se desespera e arremete contra os arqueiros, e teria alcançado-os se não fosse impedido por tropas auxiliares celtas e itálicas (retos, galos e vindélicos). Frustrado, Armínio e Inguimero fogem do campo de batalha, lambuzando o rosto com sangue dos mortos, para dificultar o reconhecimento, e a custo se salvam. Aqueles grupos que continuaram lutando foram isolados e massacrados sistematicamente até o último. Aqueles que correram para o rio foram atingidos pelas costas ou em pleno nado por flechas e pedras ou ainda arrastados pela corrente do Visurgi.  Alguns tentaram se esconder na copa das árvores. Os romanos os descobriam e os derrubavam de lá a flechadas em meio a muita algazarra. No fim desse dia de batalha os romanos computavam umas mil baixas e os germânicos mais de dez mil, espalhados numa vasta extensão da planície. Observando-os, os romanos descobriram em muitos corpos uma coisa curiosa: cadeias! Cadeias com as quais pretendiam prender os romanos derrotados, tão certos que estavam da vitória, e que devem ter atrapalhado muito na hora do combate.
__ Os romanos e seu aliados, frenéticos, quase enlouquecidos pela vitória e o cheiro do sangue e morte que exalava da campina, gritavam a plenos pulmões, agitando armas e outros troféus sangrentos: “Roma victor!” “Roma victor!” Roma vitoriosa... Germânico é erguido nos ombros pelos legionários de sua escolta pessoal. As espadas e as lanças dos legionários apontam na sua dureção: a vitória é dele.
__ Irritados com a comemoração dos romanos os germânicos, ainda em choque, tentaram, desajuizadamente, outro confronto direto, arregimentando toda gente que podiam, de velhos a adolescentes, e se puseram por trás de um sistema defensivo, um terrapleno antecedido por uma fossa, tendo um pântano de um lado e floresta do outro (onde a cavalaria ficaria de tocaia), no chamado Valo dos Angrivaros, onde eles esperavam deter a marcha das legiões rumo ao Reno. Informado previamente dos planos dos adversários, Germânico dispôs a cavalaria na planície aberta, e dividiu sua infantaria em duas colunas: uma atacaria o terrapleno e a outra a floresta.

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__ O primeiro ataque da infantaria ligeira ao terrapleno foi violento, mas os germânicos aguentaram bem e depejando muitas flechas, pedras sobre os romanos e golpes de espada e machado contra os romanos, forçaram-nos a recuar. Germânico, agora conhecedor dos pondos fortes e fracos dos defensores, faz avançar as linhas dos fundibulários e arqueiros que fazem cair uma chuva de projéteis sobre os germânicos, enquanto a infantaria legionária avança para um segundo assalto. Os germânicos sentem o impacto e sua linha de defesa colapsa, e eles são obrigados a se retirar em meio á uma tormenta de flechas e pedras.

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__  Na floresta, as unidades romanas também encontraram uma defesa desesperada, mas fazendo uso da superioridade de seu armamento e da grande disciplina tática, avançam de maneira metódica e organizada, a inflingir baixas terríveis nos grandalhões guerreiros germânicos, perfurando-lhe os órgãos sensíveis no dorso, num movimento de baixo para cima, enquanto se defendiam, com seus escudos, do que lhes era dos golpes daqueles vindos de cima para baixo. Entre os romanos estava Germânico, perfeitamente identificado com seu vistoso uniforme de comandante, incitando os soldados a não deixar ninguém vivo, a não fazer prisioneiros, pois essa seria a única forma de acelerar o fim da guerra. E assim foi feito...  
__ De volta para as bases de inverno, porém, as legiões romanas quase sucumbem a outro desastre... meteorológico. Após embarcarem em navios no rio Amísia, as legiões seguiram para o norte onde chegaram à foz do rio, no Mar do Norte, e seguiram rumo a oeste, no que seria hoje a costa da Holanda. Nesse momento desaba sobre a frotilha uma extravagante tempestade que ameaça destruir todos os barcos. Em apuros, vendo as ondas assomarem o convés, cavalos, mantimentos e até armas são lançadas ao mar para impedir o naufrágio, enquanto os barcos são dispersos, e alguns vão acabar nas terras dos angrivaros, que, para sorte dos romanos haviam mudado de lado, e outros na Grã-Bretanha, sendo posteriormente devolvidos com as suas guarnições. Aportando às pressas numa ilha, Germânico, já esgotado pela campanha, foi tomado por um pânico religioso, e começou a bradar ser o responsável por aquilo, sendo necessário que seus amigos o contivessem para evitar que se lançasse ao mar...
__ Um general romano pode até dar um chilique; mas não pode nele permanecer porque o dever para com Roma é 24 horas por dia. Foi só terem a notícia de que uma quantidade gigantesca de corpos cavalos, equipamentos de guerra, maquinas, apareceram boiando junto às praias, que os germânicos começaram a se eriçar e a pensar em novas aventuras militares. Sabedor disso, Germânico despacha imediatamente o legado Silio, com 30 mil homens e 3 mil cavaleiros, contra os catos para fazer o de sempre: não deixar nada vivo ou de pé; ele mesmo à frente de forças maiores invadiu a região dos marsos, que acharam mais prudente se render a ele e revelar o paradeiro de mais uma das águias das legiões massacradas em Teutoburgo – esta estava enterrada numa floresta – depois do que saiu desfilando por aquelas terras, batendo todos os que cometeram a loucura enfrentá-lo. Não houve nenhum grande massacre, pois o simples anúncio da presença de legiões na proximidade fez a maioria dos rebeldes correr para as florestas.
__ Terminadas essas operações Germânico voltou com suas tropas para os fortes na fronteira onde deveria passar o inverno (abaixo). Os germânicos estavam impressionados: como eles, os romanos, conseguiam todo esse poderio? A produção crescente de excedentes e o comércio em larga escala explicam, e por falar nisso, enquanto Germânico pensava nas próximas operações e talvez até na conquista definitiva da Germania Magna, entraram em campo os mais poderosos generais do exército, para dar a palavra final a respeito do assunto, e dizer o que Germânico podia fazer: os contadores....

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A tragédia continua
__ Quando o imperador Tibério recebeu o relatório dos custos das operações de Germânico, se os romanos conhecessem a expressão “ter um filho preto pelo pé”, eles a teriam dito a respeito daquele. E a ordem veio peremptória: “Parem imediatamente as operações militares na Germania!” E Tibério tinha toda razão:
__ A primeira questão de honra, o massacre sem aviso das legiões, fora alcançado com vitórias brilhantes e o massacre inesperado de várias aldeias germânicas, sem falar que o número de vítimas entre estes superava, agora, de muito as perdas romanas.
__ A segunda questão de honra, a perda das águias, fora quase toda resolvida; e a maioria das águias (duas) foi recuperada.
__ Terceiro: o rebelde e taidor, Armínio, que era cidadãos romano, fora exemplarmente punido, perdera quase todo o seu exército e tornara-se um chefe desacreditado entre os seus. Não oferecia mais perigo a Roma.
__ Quarto: a Germania é imprevisível até no clima! Por duas vezes os romanos estiveram perto de uma grande catástrofe. Até quando conseguiriam driblar a natureza e a meteorologia surpreendente daquela região, que os romanos, mediterrâneos, tanto temiam e evitavam?
__ Quinto: não havia como evitar a transferência de cultura e tecnologia de todos os tipos para a Germânia, inclusive a militar, e Armínio era um exemplo, por causa da interação entre as culturas, que tornariam suas tribos cada vez mais difíceis de serem derrotadas, como Teutobrugo e essa campanha mesma haviam demonstrado. As campanhas tenderiam a ser sempre mais onerosas e difíceis em todos os sentidos.
__ Sexto: a Germânia era uma região inóspita e cheia de florestas, onde povos tribais, ciosos de seus costumes e liberdade, podiam se ocultar, enquanto submetiam as legiões a uma guerrilha interminável. O que havia para além? Apenas as planícies da Polônia e da Rússia, das quais os romanos, sem uma população autóctone amigável, só poderiam colher resfriado. De uma certa forma os romanos já forçavam muito a si próprios investindo tantos recursos na manutenção da Britânia, porque arranjar mais um escoadouro de recursos, por uma terra que não tinha, naquela época, nehuma riqueza substancial à vista, um comércio próspero, etc. Definitivamente não fazia mais sentido manter aquelas operações.
__ Sétimo: o próprio Otaviano Augusto determinara em testamento que o Reno deveria ser a fornteira natural entre o mundo romano e os povos da Germânia.
__ A política romana para região foi, portanto, consolidada por Tibério: não ocupar território a leste do Reno, deixando esses povos entregues à sua sorte; fazer alianças ora provisórias ora permanentes com alguns grupos, em vista aos interesses estratégicos romanos na região, aproveitando do ardor guerreiro dos germânicos para jogar um grupo contra o outro indefinidamente, sem gastar muito dinheiro com isso.
__ E, acima de tudo, Tibério aspirava manter um general em ascensão longe de Roma e de seu trono. Germânico tinha ‘tudo’ contra si. Era uma general muito competente, um gênio militar de primeira grandeza, com uma capacidade de liderança e motivação  formidável sobre seus comandados, além de ser uma pessoa de trato fácil e gentil, que encantou as massas de Roma, durante o seu desfile triunfal. Exatamente o oposto de Tibério, um homem reservado, enrustido, que alimentava um sentimento desconfiança doentio contra tudo e contra todos, de trato muito desagradável. A atmosfera ficava “pesada” ao seu redor. A última coisa que Tibério queria era um Julio Cesar, turbinado pela Germania, junto a ele, e até na Europa, por isso mandou-o para uma das Sibérias do império romano: ao Oriente, à Síria, para difíceis missões junto aos soberanos locais, com um espião e amigo sua inteira confiança, Cneu Calpurnio Pisão, num posto superior, para ficar na cola do incauto desafeto.
__ As desavenças entre Germânico e Pisão foram inevitáveis, pelas medidas desmoralizantes que este tomava contra aquele, que resolveu largar a Síria e retornar à Roma. Entretanto, mal expôs seu projeto caiu doente, em Antioquia, capital da Síria, e no dia 10 de outubro de 19 morreu em meio a terríveis sofrimentos, não sem antes expressar a crença de que tinha sido envenenando por Pisão e pedir à sua mulher, em testamento, que vingasse a sua morte. A notícia disso causou sensação em Roma e um movimento furioso de identificar e punir os responsáveis começa a subir os escalões do poder até chegar em Tibério – este não participara da cerimônia fúnebre a Germânico nem proferirá uma só palavra a respeito de sua morte. Nas ruas o povo começa a se amotinar. As tropas ficam inquietas.  
__ Tiberio toma a iniciativa rápida de entregar Pisão ao julgamento no Senado e não toma a sua defesa, deixa-o entegue aos senadores, e este, percebendo que a sua pena era inexorável comete suicídio ou foi “suicidado” por alguém na prisão – fala-se na participação de laguém próximo a Tibério. No final, assim como o nebuloso assassinato do presidente americano John Kennedy, nada ficou definitivamente provado. Embora para o grande público Tibério passe para a história como o mandante e o principal interessado na morte de Germânico.

O preço da derrota
__ Armínio terminou a campanha de 16 encurralado. Deve ter se sentido solitário, nesse momento! Teutobrugo prometia um prestígio militar, uma vitória espetacular sobre o maior império do mundo, e, quem sabe, até que o início de um império querusco, englobando uma federação de povos,  sobre a Germania, capaz de negociar com Roma de igual para igual. Já imaginaram, devia pensar ele, a garra e a força dos germânicos aliadas às técnicas militares aprendidas dos romanos!
__ Convenhamos: Armíno foi ingênuo e não percebeu que a principal força de Roma não estava nas armas incríveis, na disciplina tática, no número de seus soldados mas em toda uma estrutura previa, anterior, tanto econômica como ideológica, que tornava possível um exército gigantesco, coeso e motivado. No plano econômico os germânicos jamais poderiam criar recursos que lhes permiotissem contrapor a Roma forças esquivalentes, sem uma profunda reforma de seus costumes e tradições, que eram, justamente, o que eles mais queriam conservar! Tampouco os germânicos conseguiriam algo relevante nesse sentido se não conseguissem superar a mentalidade tribal por outra que os unissem como causa comum, da mesma forma que Roma unia seus generais, soldados, povo e aliados em torno do ideal de uma cidade viva, uma deusa, uma mãe nutriz, à qual se devia lealdade ao preço da própria vida.
__ Não que os germânicos não fossem capazes de dar a vida por uma causa, e bem que o davam, e até com muita frequência, só para encher o saco ou descorçoar outro germânico a quem roubara algo ou matava, em infindáveis acertos de contas e razias familiares. Essa era a liberdade tribal que eles gozavam e queriam manter, e foi em nome delas que Armínio começou toda essa guerra que no final deveria presentiar os germânicos justo com aquilo que eles não queriam: a perda da liberdade tribal e dos costumes antigos. O que Arminio propunha era sacudir o jugo romano para os germânicos incorporarem o jugo dele próprio e de seu povo. Ao invés de terem um chefe, numa numa cidade esquisita, a milhares de quilômetros de suas terras, os germânicos passariam a ter um chefe local a dizer-lhes o que seria melhor fazer, justo por ter aprendido com o inimigo a como fazer isso. Creio que alguns germânicos começaram a pensar que estavam trocando seis por meia dúzia.
__ Armínio, entretanto, continuava a alimentar a ideia de uma aliança de povos, e continuava a sua pregação por uma federação germânica – já dera a mulher e um filho pela causa – principalmente entre os chefes do seu povo e aqueles que lhe eram mais próximos, e ainda conseguiu, entre os anos 17 e 18, vencer com sua gente o poderoso reino germânico dos marcomanos, cujo rei foi obrigado a pedir asilo em Roma – os romanos não o ajudaram, porque na campanha de 14-16 ele preferiu ficar neutro, e não deu ajuda aos romanos. Mas foi justamente nas mãos de parentes proximos que encontrou a morte de maneira misteriosa, provavelemtne envenenado, no mesmo ano que Germânico.

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 __ Os legionários da fronteira com a Germânia, algumas das tropas mais duras e bem preparadas do exército romano, tinham uma alegria especial: as traquinagens de seu mascote, um garotinho de três anos chamado Caio Julio Cesar Germânico, o filho de seu querido comandante, Germânico Julio Cesar, que passeava entre eles, vestido de legionário, com uma caliga, bota militar, adaptada, parecendo um soldadinho de verdade. Era a alegria dos soldados e o orgulho do papai, que imaginava estar assim preparando o menino para a dura vida militar, que era o mínimo que se esperava de um bom cidadão romano, bem como de um pretenso herdeiro ao posto de comando do império. Os legionários o chamavam de “calígula”: “botinha”.
__ Esse garoto, porém, seja pela violência e pelo estresse que viveu nas campanhas militares ou pela convivência pacífica, mas doentia e cheia de perigos, com os poderosos de Roma, sem falar do fim trágido de seu pai, ou fosse ainda por causa de uma doença estrutural, uma psicose – alguns imaginam a esquizofrenia – ou como sequela de uma doença gravíssima que o acometeu em 37, e da qual quase não escapou vivo, tornou-se, com o passar do tempo, um psicopata, um monstro de depravação e crueldade, e também governante máximo do Império Romano, sucedendo a Tibério, a partir de 18 de março de 37.

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__ Em 24 de janeiro de 41, enquanto se dirigia ao Fórum de Roma, para a habitual reunião do Senado e audiências diversas, o jovem imperador Calígula, ou Botinha, andava despreocupado entre cortesões e guarda costas; certamente pensava nas últimas perversões que havia praticado com seus áulicos e, quem sabe, imaginando outras ainda mais perversas e degradantes para aquele dia, quando de repente sente uma dor intensa e profunda no abdômen. Ele sai de seus pensamentos e vê, à sua frente, a Cassio Querea, um dos mais elevados oficiais da Guarda Pretoriana, e, até ali, o seu “saco de pancadas”. Quereas tinha um punhal ensanguentado nas mãos. Botinha, horrorizado, descobre, segurando o lugar onde doía, que é o seu sangue, que fora ferido, e antes que pudesse esboçar qualquer gesto de defesa ou mesmo gritar de dor e de medo ante o desenlace que se avizinhava, sentiu uma série de pontadas e dores excruciantes apor todo o seu corpo, conforme os punhais e adagas de outros guarda pretorianos e conspiradores lhe penetravam até perder definitivamente os sentidos e cair no chão, sobre uma poça de sangue, num fim infame de um homem infame, filho de um dos maiores generais de Roma...
__ Na casa de uma ricaça italiana uma senhora germânica escrava, de cabelos louros embranquiçados, preparava cuidadosamente o toucador de sua senhora, enquanto se informava sobre as últimas notícias, que a ama falava sem parar, mostrando grande nervosismo: “Que absurdo, mataram o imperador!... tenho que me preparar para as exéquias... que amolação, logo hoje!... mas que mundo é esse? ??? Tire esse sorriso idiota da boca!...”

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__ Poucos dias depois, num forte da fronteira do Reno, um grupo de cavaleiros germânicos se aproxima da paliçada e comunica algo à sentinela. Um soldado vai até o centurião no comando, que naquele momento se aquecia em frente a um fogo dentro de um aposento. “Alguns bárbaros estão aí e querer falar-lhe”. O centurião pragueja e pronuncia um monte de maldições, enquanto veste um grosso agasalho de pele de urso, e coloca o elmo com um vistoso penacho, antes de sair da casa, rumo à uma paisagem fria e hostil, coberta de neve. Completam o quadro um céu cinzento escuro e um vento frio penetrante...
__ Os portões se abrem e o centurião sai, acompanhado de um grupo de soldados prontos para qualquer eventualidade. Do alto da paliçada um grupo de arqueiros se posiciona. Um mediterrâneo típico, ele se admira ao ver os rudes cavaleiros com roupas tão mais leves que a sua. “São filhos de urso!” Pensou, embora fosse ele, com o seu capote, quem mais parecia um urso.
__ “Ave” disse ele, fazendo o tradicional gesto romano: braço direito erguido. O cavaleiro que estava à frente limitou-se a fazer um sinal para outro e este, descendo do cavalo, foi até o centurião e entregou-lhe algo envolvido numa pele mal curtida. O centurião recebeu aquilo, admirado, e antes que pudesse dizer algo os cavaleiros se afastaram a toda rédea e começaram a atravessar lentamente sobre o Reno.
__ “Veja centurião, eles cavalgam sobre o rio congelado”, observou um soldado.
__ “É, esse ano o gelo deve ter ficado mais grosso... Isso ainda nos vai causar problemas!”
__ Os soldados se acercaram, curiosos e tumultuários, ao centurião que começou, cheio de desconfiança, a desamarrar os cadarços que envolviam ao embrulho. Quando finalmente apareceu o conteúdo. Os soldados então fizeram um profundo silêncio e lágrimas rolaram pelo rosto do centurião...
__ Era a águia que ainda faltava das legiões exterminadas em Teutoburgo...    

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Fonte principal: Spedizione germanica di Germanico - Wikipedia em italiano.

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