A CAMPANHA DE GERMÂNICO (14-16) OS LIMITES
DO IMPÉRIO
Prof Eduardo Simões
O cenário das operações
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Di Cristiano64 - Opera propria, CC BY-SA
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__ Vemos no mapa a fronteira dos domínios
romanos ao longo do rio Reno, durante as operações de contenção levadas a
efeito por Tiberio (setas vermelhas), após o massacre de Teutoburgo. No
conjunto temos:
a) As porções verde escuras mostram os
povos germânicos aliados aos romanos: no norte, junto à foz do Reno, temos: os
frísios, os batavos, caninefates e camavos; ao centro temos; um pouco abaixo os
sicâmbrios e os têncteros, e mais abaixo, numa cunha feita pelo curso do rio,
temos: os vangiões, os nêmetes e os tribocos.
b) Em amarelo os grupos independentes, mas
clientes de Roma: no norte, junto à foz do rio Elba temos: os casuaros, os
amsivaros e os caúcos; ao sul, na área maior, os ermunduros, marcomanos,
naristos e quados.
c) Em róseo temos a área de domínio dos
povos que ofereciam resistência à dominação romana: angrivaros, brúcteros, queruscos,
usípetes, marsos, catos, matiacos.
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__ Entre 11 e 13, as regiões à margem
direita do Reno assistiram às tépidas operações militares de Tibério César,
mais no sentido de fortalecer a aliança com os povos aliados, procurando conter
uma explosão de revoltas na fronteira, que punir a afronta
sofrida em Teutoburgo, não só pela falta de recursos, mas também porque os
olhos e a preocupação maior de Tibério estava a milhares de quilômetros dali,
em Roma, onde dava sinais de fim próximo o seu pai adotivo, o príncipe-imperador
Otaviano Augusto, e começava a se desenhar uma luta pela sua sucessão, que
Tibério não queria ficar de fora. Deve ter sido com certo alívio quando ele,
afinal, deu por encerrada a sua participação e voltou para Roma, em outubro de
12, para celebrar as suas vitórias na Panônia (partes da Hungria, Áustria,
Croácia, Eslovênia), deixando o teatro de operações nas mãos de um general
jovem e competente: Germânico Julio César (abaixo), filho de outro general que,
trinta anos antes, havia feito muito estrago entre as tribos germânicas: Nero
Claudio Druso Germânico.
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By Self-photographed — PierreSelim (taken in 26 october 2012), CC0,
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__ Para Tibério, assimilando a doutrina de
Otaviano, a fronteira ideal para o império na região seriam as terras à margen
esquerda Reno, também chamada de
Germânia Inferior, isoalda pelo rio dos
povos da Germania Magna, terras entre o Reno e o Elba, por uma série de
fortins e paliçadas, nos pontos em que o Reno era mais delgado, ao mesmo tempo
em que estava convencido de que não haver, para lá do Reno, riquezas que
compensassem os custos de operações militares contra os povos locais. Era
melhor esquecer o incidente em Teutoburgo. Entretanto não era assim que pensava
Germânico Julio Cesar (acima), que aproveitou a ausência do seu superior e
rival político para acumular recursos e conseguir patrocinadores para punir
exemplarmente os autores da emboscada às legiões de Varo e recuperar as águias
das legiões massacradas. Para isso ele dispunha de oito legiões: a XXI Rapax, a
V Alaudae, a I Germanica, a XX Valeria Victrix, a II Augusta, a XIII Gemina, a
XIV Gemina e a XVI Galica. Uma emboscada em tempo de paz é só uma emboscada em
tempo de paz; Roma agora iria mostrar como é que se faz uma guerra de verdade! Esse
era o espirito que o animava.
__ Havia entretanto um problema, com a
morte de Augusto os veteranos das legiões mais antigas se revoltaram, afinal
eles vinham de 20 anos de campanhas duríssimas, e achavam que já haviam
adquirido algum direito à reforma e a um aumento substancial de soldo.
Germânico agiu com presteza e satisfez todas as reivindicações dos legionários,
e ainda presenteou-os com um soldo que era o dobro do que pediram, após o que
recebeu o juramento de lealdade das tropas, e partiu para a sua campanha.
Início
das operações (ano 14)
__ A primeira medida foi devolver a
emboscada a Varo com outra, dirigida aos marsos, aliados de Armínio. No ano de 14
ele construiu uma ponte e atravessou o Reno com 4 legiões (12 mil soldados), 26
coortes de infantaria auxiliar e 8 alas de cavalaria, para cobrir os flancos
das tropas. Suas tropas avançaram até os restos de uma velha fortaleza, na floresta
de Cesia, atual cidade Delbrück. A data escolhida para o início das operações
fora cuidadosamente pensada. Era dia de uma importante festa religiosa dos
germânicos, que, como era de praxe nessas ocasiões, os homens bebiam até não
poder mais, ficando logo imprestáveis.
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__ As legiões foram espalhadas em quatro colunas
diferentes, para abarcarem uma grande extensão de terreno e fazer o maior
estrago possível, num arco de umas 50 milhas, aproveitando-se que era uma noite
de lua cheia, e seria mais fácil divisar os alvos, podendo caminhar pela
floresta sem luz artificial. A ordem era uma: todos germânico que estiver ao
alcance de uma arma romana, independente de idade e sexo, deve ser abatido
imediatamente. Não haveria prisioneiros. Os legionários, ao sinal combinado,
como máquinas, caíram ao mesmo tempo sobre várias aldeias e foram matando, sistematicamente,
todos que lhes caiam nas mãos. Mulheres e crianças, as que conseguem, correm
para as matas gritando e chorando frenéticas. As que tentam resistir morrem com
os homens, estes sem nem o saber, após o que as aldeias são queimadas junto com
os corpos, inclusive o templo de uma deusa, muito cultuada por esse povo.
__ Aldeias próximas de brúcteros, tubantes
e usípetes, são alarmadas pela gritaria e o clamor difuso que se alevantavam
das aldeias marsas, e acorreram em armas para atacar os romanos,
alcançando-lhes a retaguarda, onde estava a XX. Os romanos, já preparados para
isso e comandados pessoalmente por Germânico, conseguiram rechaçar o ataque,
voltando em seguida para os seus quarteis de inverno.
__ Assim acabou o ano 14
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Novos
confrontos
__ No ano seguinte, 15, partiu uma nova
expedição romana, dessa vez com as tropas divididas em duas colunas: uma,
comandada por Aulo Cecina Severo, sairia da fortaleza de Castra Vetera, com 4
legiões (12 a 15 mil homens), 5 mil auxiliares, mas algumas tropas de aliados
germânicos da margem esquerda do Reno; outra sob o comando de Germâncio, sairia
de Mogontiacum (atual Mainz), com 4 legiões, e o dobro de aliados germânicos.
Germânico fez seu ponto de apoio nas ruínas de uma fortaleza em Monte Tauno
(norte da atual Frankfurt).
__ Germânico avança rápido no coração do
território dos calcos e vai exterminando a todos que encontra pela frente. Quem
tentou se opor pereceu enquanto muitos jovens e adolescente, fugindo daquele
rolo compressor, se atiram no rio Adrana
(atual Eder) e se afogam. A capital dos catos, Mattium (atual Niedenstein), é tomada
e meticulosamente saqueada e incendiada. Depois ele volta calmamente para o
Reno. Ninguém ousou enfrentá-lo.
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__ Mais ao norte Aulo Cecina consegue
conter os grupos de queruscos que tentam ajudar aos catos. Os marsos se
arriscam a uma confronto direto com ele, mas são derrotados.
__ Germânico chegara a uma fortaleza na
margem romana do Reno quando foi avisado, por uma embaixada do querusco aliado
de Roma, Segeste, sogro de Armínio contra a vontade, de que naquela hora se
achava cercado pelos queruscos partidários do chefe rebelde e precisava de
ajuda romana. Germânico partiu prontamente e conseguiu levantar o cerco contra
o aliado que, ao final, lhe entregou um presente inesperado: a sua própria
filha, Thusnelda, que tanto desgosto lhe causara. Ela encarou o pai com dureza
e queixo erguida, enquanto este, sem dizer nada, deu-lhe as costas.
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Di Karl Theodor von Piloty - Web Gallery of Art: Image Info
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__ Thusnelda, que era a esposa preferida de
Armínio e estava grávida de um filho deste, foi levada a Roma e obrigada pelas
ruas da cidade no triunfo de Germânico, no ano 17, estando entre os presentes o
seu antigo pai... Algum tempo depois de capturada ela dará a luz a um filho de
Arminio, chamado Tumélico, que, supõe-se, foi entregue a uma escola de
gladiadores, e, segundo os dados disponíveis, teria morrido antes dos 20 anos.
E ela? Provavelmente foi feita escrava e vendida para algum ricaço romano. Após
o desfile a história silencia a seu respeito. Nada mais sabemos... A imagem
acima, feita por um pintor alemão do século XIX, Carl Theodor von Piloty,
mostra os prisioneiros germânicos desfilando diante do imperador. Os
germânicos, embora vencidos, são belos, vistosos e estão na luz, enquanto os
romanos são apresentado de modo caricato, como os soldados em primeiro plano,
ou estão nas sombras, afinal para os alemães Armínio e os seus podem ser considerados
os fundadores da nacionalidade alemã. O pai de Thusnelda está na imagem, de pé,
ao lado de Tibério, com a cabeça baixa, sabe lá se com vergonha da filha ou de
si mesmo... É uma obra de arte politicamente muito engajada.
__ Armínio, é claro, não ficou imóvel e
começou a articular, junto com os chefes de outros povos, uma grande sublevação
contra o invasor, ao mesmo tempo em que, alertado desses preparativos,
Germânico preparou outra campanha ainda para aquele ano, da seguinte maneira:
a) Aulo Cecina, com 40 coortes (20 mil
soldados, incluindo auxiliares), invadiu o território dos brúcteros, em direção
ao rio Amisa (atual Sem).
b) o prefeito Pedone conduziu as unidades
de cavalaria, pelo país dos frísios, em direção ao mesmo rio.
c) Germânico seguiu com 4 legiões (20 mil
homens) embarcadas, seguindo o trajeto do rio, para se encontrar com os outros
dois no estuário do Amisa, talvez na atual Bentumersiel (Baixa Saxônia).
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__ Após a reunião dessa forças ele
determinou a um oficial Lucio Estertinio a seguir com a infantaria e cavalaria
ligeira pelas terras dos brúcteros, arrasando sistematicamente tudo à sua
frente. Essa ação, entretanto, teve um resultado inesperado: foi encontrada a
águia da legião XIX, exterminada em Teutoburgo. Após ter exterminado todos os
inimigos ao longo de um vasto território, Germânico avançou bem no coração da
Germania Magna e se dirigiu até Teutoburgo, para prestar honras aos legionários
que morreram. À frente marchava Aulo Ceccina e suas tropas, preparando o terreno
para o grosso do exército que seguia atrás, por meio de pontes, rampas e
aterros, até que o grosso do exército penetrou em densas florestas, envolvido
por uma paisagem macabra (acima), até que chegaram ao lugar fatídico:
“Pelo
chão, espalhavam-se pilhas de ossos embraquiçados ao tempo... por todo o
entorno... fragmentos de armas e carcaças de cavalo. Viam-se crânios presos aos
galhos das árvores. Nos bosques sagrados das proximidades foram vistos altares
onde os germânicos sacrificaram oficias de alta patente, tribunos e centuriões.
Sobreviventes da batalha, que haviam escapado à prisão, apontaram o lugar onde
haviam visto cair mortos os legados [oficias superiores], e onde haviam sido arrebatadas
as Águias, e mostraram onde Varo recebera a sua primeiro ferimento, e onde se
bateu até a morte, cometendo ao final o suicídio. Mostraram uma elevação, onde
Armínio teria falado aos seus, e as numerosas forcas preparadas para os
prisioneiros, e a arrogância e o desprezo com que Armínio havia mandado sepultar,
numa vala comum, as insígnias e a Aguia imperial [cada legião levava vários
sinais de identificação: bandeirolas, esculturas, etc., cuja preservação era
ponto de honra]” (trecho de Anais de
Cornelio Tacito, traduzido de Spedizione
germanica di Germanico – Wikipedia em italiano).
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__ Nesse momento é detectada a presença de
Armínio nas redondezas e vários esquadrões de cavalaria foram mandados para
persegui-lo, Arminio, fingindo fuga, atraiu-os para um lugar de densa
vegetação, e fez cair sobre eles uma emboscada, que começou a causar pânico
entre os cavaleiros. Nesse momento chega a infantaria ligeira para dar suporte
à cavalaria, mas só aumenta a confusão. Germânico faz então avançar
ordenadamente as legiões que tinha, equilibrando o combate, forçando a retirada
dos germânicos.
__ Após o confronto, Aulo Cecina, à frente
de 40 coortes, tomou um itinerário conhecido como das Pontes Longas, que,
através da floresta, cruzavam uma zona de pântanos, e haviam sido construídas
pelo cônsul Lucio Enobarbo, uns 18 anos antes, numa das intermináveis campanhas
dos romanos na Germânia. Entretanto, ao chegar lá percebeu que as ditas pontes
tinham sido destruídas, por isso fez alto e começou o trabalho de reconstruí-las
com seus soldados, não sem antes escolher um local seco e elevado, onde mandou
construir uma acampamento com todos os cuidados e recursos de segurança comuns
aos acampamentos romanos. Os romanos estavam nesses trabalhos quando os
germânicos atacaram em massa as tropas que estavam a refazer a ponte de madeira
sobre o pântano.
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__ O choque foi tremendo, e mais uma vez os
romanos estavam em desvantagem, lutando com o seu equipamento pesado em um solo
muito mulhado e escorregadio, que atrapalhava, inclusive, no arremesso das
lanças da infantaria, enquanto os alemães, mais leves a acostumados ao terreno,
lançavam as suas com grande precisão causando muitas baixas. Para a sorte dos
romanos a noite desceu, e os germânicos cessaram o seu ataque, embora estes
continuassem dentro da mata, em grande algazarra. Aulo Cecina então organizou taticamente
as suas legiões a V Alaudae à esquerda a XXI Rapax à direita, a I Germania ao
centro e a XX Valeria Victrix na retaguarda, criando um anel de proteção em
torno das tropas atacadas, restabelecendo um pouco do moral da tropa.
__ Aquela noite no pântano foi pavorosa,
para os romanos, que ouviam os cantos e as vozes festivas dos germânicos
ecoando pela mata, já comemorando a derrota dos invasores. Diz o historiador
Tácito, que, insone, Aulo Ceccina teria visto visto o espectro de Varo sair da
lama do pântano, todo ensanguentado e coberto de musgos, estendo-lhe a mão como
a dizer-lhe: “vem comigo”, mas aquele recusou-a. Quarenta anos de serviço deram
a Ceccina a calma e o sangue frio para não entrar em pânico. E bem que havia
motivos para pânico: à noite, procurando, se instalar em terra seca, a V e a XXI
deixaram as suas posições, sem comunicar nada a Cecina, deixando as tropas
auxiliares e a bagagem expostas ao ataque. Arminio não desprezou a
oportunidade.
__ De manhã, enquanto uma névoa se
dissipava, ouviu-se um brado em um latim, saído da floresta: “Aqui Varo e suas
legiões enfrentaram o mesmo destino, presos por um laço”, ao mesmo tempo em
que, gritando loucamente, milhares de germâncios com sua grande estatura e
aspecto selvagem saem da mata e se atiram sobre as exaustas tropas auxiliares
que forcejavam com a bagagem. A tropa começa a mostrar sinais de pânico. Cecina
atordoado e a se perguntar “como eles passaram pela V e a XXI?” Cavalga então com pressa para a frente, a
fim de organizar a defesa, mas logo que chega seu cavalo é atingido por uma flecha
na barriga e cai, arrastando consigo o cavaleiro. Os germânicos se animam mais
ainda e avançam na direção de Cecina. Nesse momento a I Germania, que estava à
frente, ouvindo o baraluho do combate, voltou, e carregou sobre os germânicos
com grande impacto, obrigando-os a recuar, depois de muita luta, salvando na
última hora o dia e o seu comandante.
__ Os romanos então se posicionam num lugar
mais elevado e seco e procuram montar um acampamento defensivo improvisado, com
grande sacrifício pois boa parte das ferramentas se perdera junto com os muitos
vagões de bagagem na batalha. Foi outra noite de vigília e preocupação, mas a
tropa permaneceu coesa, enquanto mensageiros foram mandados para contatar as
outras legiões.
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__ No dia seguinte os germânicos atiraram
com toda gana contra o acampamento romano, para o ou tudo ou nada. A I e as
tropas auxiliares aguentaram bem o tranco, enquanto os germânicos se amontoavam
cada vez mais junto a eles, tentando com empurrões forçar as tropas romanas a
se desagregarem e dispersarem. Quando Cecina sentiu que a sua concentração
atingira o auge, deu ordem para os músicos tocarem na cornu (uma enorme
trombeta) um sinal convencional. Nesse momento duas muralhas de escudos
formadas pela V e a XXI apareceram nos dois lados dos atacantes. De dentro
dessas muralhas, lanças romanas, uma maravilha de engenharia militar (penetra o
corpo com facilidade, mas dificilmente fica presa aos ossos), se projetam e
recuam, e vão perfurando o que estiver à frente. A fileira de trás empurra a da
frente, e ai de quem cair! Os legionários tentam firmar os pés sobre os corpos
dos germânicos caídos, pisando-os com força, quebrando ossos, é uma máquina,
uma morsa com dois mordentes se fechando. Os germânicos tentam resistir, em
vão, Arminio teve que abandonar a batalha bastante ferido, assim como o seu tio
Inguiomero, outro líder dos revoltosos. Seguiu-se um massacre horripilante,
após o qual os romanos, após uma grande comemoração, seguiram o seu caminho
para invernar na margem ocidental do Reno, onde encontraram todos em polvorosa,
pois a notícia de seu cerco chegara, junto com o boato de que os germânicos
iriam, por isso, invadir as Gálias, e muitos já falavam em derrubar a ponte
sobre o rio, impedida na última hora pela intervenção pessoal de Agripina, a
esposa de Germânico.
__ Mais ao norte, porém, aconteceu uma
tragédia. A coluna de Públio Vitelio, formada pelas legiões II Augusta e XIV
Germania, teve que se retirar por terra, pelas terras baixas do norte, na atual
Holanda, e justo quando passavam por essa parte do terreno sobreveio uma
tempestade incomum, e a maré avançou sobre as praias, engolindo uma grande
quantidade de soldados, animais e bagagem. A maior parte das legiões,
entretanto se salvou, amontoada em desordem, sobre um banco de areia mais
elevado, até que no dia seguinte foi salva por uma forta trazida por Germânico,
pelo Mar do Norte.
As
operações no ano 16
__ Após dedicar um longo tempo, junto com
seus oficiais, ao estudo das lições tiradas dos dois primeiros anos de guerra
Germânico chegou às seguintes conclusões:
a) Embora vulneráveis em áreas abertas, os
germânicos eram muito difíceis de serem derrotados dentro de suas florestas e
pântanos, além de serem favorecidos pelo inverno precoce e longo em seu país.
b) Ao se deslocarem pelas florestas, em
caminhos inadequadas, os romanos eram obrigados a estender suas linhas, o que
os deixava sujeitos a constantes contra-ataques e ações de guerrilha, sem falar
que os soldados chegavam às batalhas já esgotados pela caminhada e o peso da
bagagem.
c) Os auxiliares gauleses estavam perto do
esgotamento quanto à sua capacidade de fornecer comida e armas aos legionários.
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__ A solução encontrada foi embarcar a
maior parte dos suprimentos e das máquinas de guerra em navios, além de
soldados. Para isso foram despachados engenheiros e construtores navais para
reforçar a chamada Classis Germanica, que era o nome da frota de barcos romanos
que fazia a vigilância no Mar do Norte e nos rio da região, criada por Augusto.
Seria uma grande operação anfíbia, cuja viabilidade demandou adaptações
tecnológicas nos barcos: popa e proa estreitas, mas bojo largo, para dar-lhe
mais estabilidade nas águas revoltas do Mar do Norte; quilha aplainada para
reduzir o calado, e, consequentemente, as possibilidades de encalhar; encaixes
para o leme na proa e na popa, permitindo que o navio fizesse rapidamente a
marcha a ré, etc. No início das operações Germânico tinha à sua disposição cerca
de 1.000 barcaças.
__ Seguindo pela margem ocidental do Amisia
(Ems), Germânico desembarcou à altura de Kalkriese-Teutoburgo, e mandou um
legado com tropas auxiliares devastar a terra dos catos, enquanto ele se
dirigia ao forte de Aliso (atual Haltern), para liberá-lo de um cerco, com oito
legiões. Os germânicos fugiram ante a notícia de sua aproximação, e ele avançou
para Teutoburgo, onde constatou que o monumento a Varo e seus companheiros fora
destruído. Reconstruiu-o e, abastecido pela frota, continuou a marcha, não sem antes
destacar um comandante, Stertino, com tropas auxiliares, para devastar as
terras dos angrivaros, autores do sacrilégio, e avançou em marcha forçada para
o leste, na direção do rio Visurgis (atual Weser). Lá chegando, encontrou
afinal o que esperava: Armínio e seus queruscos, do outro lado do rio. Os dois
exércitos miraram-se com ódio recíproco.
__ Nesse momento ocorre um fato inusitado,
segundo o historiador Tácito: Armínio indaga se um seu irmão, de nome Flavio,
encontra-se entre os legionários, ao receber resposta afirmativa, pede para lhe
falar. Os romanos consentem. Os dois irmãos se encontram entre os dois
exércitos e, após um cumprimento constrangido, tentam convencer-se mutuamente:
Flávio pede para Armínio que abrace a causa de Roma e se submeta, Armínio, ao
contrário, pede ao irmão que permaneça fiel às antigas tradições de seu povo.
Como nenhum consegue convencer o outro, o diálogo vai ficando mais áspero e ambos
começam a insultar-se, mais um pouco e eles se atracavam ali mesmo. Estertino,
que fora junto com Flavio, intervém, e os contendores se afastam cheios de
mágoas e ressentimentos, sem aperceberem-se que não passam de peões no jogo da
história e do mundo real, que os envolvem, e de que eles não são capazes de
abarcar em toda magnitude, alguém poderá?, e destrói, sem dó, os mais nobres e
fraternos sentimentos!
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__ O
exército de Germânico compunhá-se de 1.000 pretorianos, 24.000 legionários (8
legiões), 20.000 soldados auxiliares (40 coortes), 4.000 cavaleiros (divididos
em 8 alas), 800 arqueiros montados e 5.000 germânicos aliados (batavos, ubis,
caucos, frísios, etc), o de Armínio tinha um número equivalente, embora não tão
especializados. No primeiro momento a cavalaria batava cruzou o rio e,
percebendo a retirada da cavalaria querusca, açodou-se em persegui-la, caindo numa
armadilha, e logo adiante foi envolvida pelos queruscos. O rei dos batavos,
Cariovaldo, e muitos chefes caem mortos, e o restante só escapa pela
intervenção da cavalaria pesada romana de Estertino (acima).
__ Nesse momento, Germânico, que cruzara o
rio, soube por um desertor, do lugar escolhido por Armínio para a batalha. Os
romanos montam logo um acampamento, que sofre um inopinado ataque dos
germânicos, a custo repelido.
__ Na manhã seguinte os romanos foram ao
encontro dos germânicos e os encontraram alinhados numa planície, cercada por
uma vegetação densa e... suspeita. Os romanos estavam tão ressabiados que
Germânico dispôs suas tropas de uma forma estritamente simétrica, um tanto
defensiva, por precaução contra qualquer ataque inesperado pelos flancos, bem
como tentou balancear ao máximo as tropas que dispunha, de acordo com o poder e
a capacidade de combate de cada uma. A batalha começou com a arremetida
violenta dos germânicos contra a primeira linha da infantaria auxiliar, que
cedeu e recuou, sendo escorada pela segunda linha, mais poderosa, formada por
legionários. A cavalaria germânica, com Armínio à frente, sai de surpresa de
uma floresta e tenta golpear o flanco direito dos romanos, mas é detida pela
cavalaria pesada dos romana, enquanto pelo outro lado, esquadrões de cavalria
sob o comando de Estertinio, vendo o caminho livre, entram pela floresta no
intuito de pegar a infantaria germânica pela retaguarda.
__ Num determinado momento Germânico
ordenou o avanço de suas legiões, justo no momento em que a cavalaria romana,
devidamente posicionada, lançou-se contra multidões de germânicos escondidos na
mata (acima). Aconteceu então uma barafunda total entre estes: os que
enfrentavam os romanos na planície, impactados pelo choque com as legiões,
fugiram para a floresta, enquanto aqueles que etavam ocultos na floresta
correram para a planície, tocadas pela cavalaria de Estertinio. Imaginem as
duas massas se esbarrando, em meio a uma chuva de lanças, flechas e pedras
arremessadas por legionários, arqueiros e os fundibulários das legiões.
__ Armínio se desespera e arremete contra
os arqueiros, e teria alcançado-os se não fosse impedido por tropas auxiliares
celtas e itálicas (retos, galos e vindélicos). Frustrado, Armínio e Inguimero
fogem do campo de batalha, lambuzando o rosto com sangue dos mortos, para
dificultar o reconhecimento, e a custo se salvam. Aqueles grupos que
continuaram lutando foram isolados e massacrados sistematicamente até o último.
Aqueles que correram para o rio foram atingidos pelas costas ou em pleno nado
por flechas e pedras ou ainda arrastados pela corrente do Visurgi. Alguns tentaram se esconder na copa das
árvores. Os romanos os descobriam e os derrubavam de lá a flechadas em meio a
muita algazarra. No fim desse dia de batalha os romanos computavam umas mil
baixas e os germânicos mais de dez mil, espalhados numa vasta extensão da
planície. Observando-os, os romanos descobriram em muitos corpos uma coisa
curiosa: cadeias! Cadeias com as quais pretendiam prender os romanos
derrotados, tão certos que estavam da vitória, e que devem ter atrapalhado
muito na hora do combate.
__ Os romanos e seu aliados, frenéticos,
quase enlouquecidos pela vitória e o cheiro do sangue e morte que exalava da
campina, gritavam a plenos pulmões, agitando armas e outros troféus sangrentos:
“Roma victor!” “Roma victor!” Roma vitoriosa... Germânico é erguido nos ombros
pelos legionários de sua escolta pessoal. As espadas e as lanças dos
legionários apontam na sua dureção: a vitória é dele.
__ Irritados com a comemoração dos romanos
os germânicos, ainda em choque, tentaram, desajuizadamente, outro confronto
direto, arregimentando toda gente que podiam, de velhos a adolescentes, e se
puseram por trás de um sistema defensivo, um terrapleno antecedido por uma
fossa, tendo um pântano de um lado e floresta do outro (onde a cavalaria
ficaria de tocaia), no chamado Valo dos Angrivaros, onde eles esperavam deter a
marcha das legiões rumo ao Reno. Informado previamente dos planos dos
adversários, Germânico dispôs a cavalaria na planície aberta, e dividiu sua
infantaria em duas colunas: uma atacaria o terrapleno e a outra a floresta.
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__ O primeiro ataque da infantaria ligeira ao
terrapleno foi violento, mas os germânicos aguentaram bem e depejando muitas
flechas, pedras sobre os romanos e golpes de espada e machado contra os
romanos, forçaram-nos a recuar. Germânico, agora conhecedor dos pondos fortes e
fracos dos defensores, faz avançar as linhas dos fundibulários e arqueiros que
fazem cair uma chuva de projéteis sobre os germânicos, enquanto a infantaria legionária
avança para um segundo assalto. Os germânicos sentem o impacto e sua linha de
defesa colapsa, e eles são obrigados a se retirar em meio á uma tormenta de
flechas e pedras.
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__
Na floresta, as unidades romanas também encontraram uma defesa
desesperada, mas fazendo uso da superioridade de seu armamento e da grande
disciplina tática, avançam de maneira metódica e organizada, a inflingir baixas
terríveis nos grandalhões guerreiros germânicos, perfurando-lhe os órgãos
sensíveis no dorso, num movimento de baixo para cima, enquanto se defendiam,
com seus escudos, do que lhes era dos golpes daqueles vindos de cima para baixo.
Entre os romanos estava Germânico, perfeitamente identificado com seu vistoso
uniforme de comandante, incitando os soldados a não deixar ninguém vivo, a não
fazer prisioneiros, pois essa seria a única forma de acelerar o fim da guerra.
E assim foi feito...
__ De volta para as bases de inverno,
porém, as legiões romanas quase sucumbem a outro desastre... meteorológico.
Após embarcarem em navios no rio Amísia, as legiões seguiram para o norte onde
chegaram à foz do rio, no Mar do Norte, e seguiram rumo a oeste, no que seria
hoje a costa da Holanda. Nesse momento desaba sobre a frotilha uma extravagante
tempestade que ameaça destruir todos os barcos. Em apuros, vendo as ondas
assomarem o convés, cavalos, mantimentos e até armas são lançadas ao mar para
impedir o naufrágio, enquanto os barcos são dispersos, e alguns vão acabar nas
terras dos angrivaros, que, para sorte dos romanos haviam mudado de lado, e
outros na Grã-Bretanha, sendo posteriormente devolvidos com as suas guarnições.
Aportando às pressas numa ilha, Germânico, já esgotado pela campanha, foi
tomado por um pânico religioso, e começou a bradar ser o responsável por
aquilo, sendo necessário que seus amigos o contivessem para evitar que se
lançasse ao mar...
__ Um general romano pode até dar um chilique;
mas não pode nele permanecer porque o dever para com Roma é 24 horas por dia. Foi
só terem a notícia de que uma quantidade gigantesca de corpos cavalos,
equipamentos de guerra, maquinas, apareceram boiando junto às praias, que os
germânicos começaram a se eriçar e a pensar em novas aventuras militares.
Sabedor disso, Germânico despacha imediatamente o legado Silio, com 30 mil
homens e 3 mil cavaleiros, contra os catos para fazer o de sempre: não deixar
nada vivo ou de pé; ele mesmo à frente de forças maiores invadiu a região dos
marsos, que acharam mais prudente se render a ele e revelar o paradeiro de mais
uma das águias das legiões massacradas em Teutoburgo – esta estava enterrada
numa floresta – depois do que saiu desfilando por aquelas terras, batendo todos
os que cometeram a loucura enfrentá-lo. Não houve nenhum grande massacre, pois
o simples anúncio da presença de legiões na proximidade fez a maioria dos
rebeldes correr para as florestas.
__ Terminadas essas operações Germânico
voltou com suas tropas para os fortes na fronteira onde deveria passar o
inverno (abaixo). Os germânicos estavam impressionados: como eles, os romanos, conseguiam todo esse poderio? A produção crescente de excedentes e o comércio
em larga escala explicam, e por falar nisso, enquanto Germânico pensava nas
próximas operações e talvez até na conquista definitiva da Germania Magna,
entraram em campo os mais poderosos generais do exército, para dar a palavra
final a respeito do assunto, e dizer o que Germânico podia fazer: os
contadores....
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A
tragédia continua
__ Quando o imperador Tibério recebeu o
relatório dos custos das operações de Germânico, se os romanos conhecessem a
expressão “ter um filho preto pelo pé”, eles a teriam dito a respeito daquele.
E a ordem veio peremptória: “Parem imediatamente as operações militares na
Germania!” E Tibério tinha toda razão:
__ A primeira questão de honra, o massacre
sem aviso das legiões, fora alcançado com vitórias brilhantes e o massacre
inesperado de várias aldeias germânicas, sem falar que o número de vítimas
entre estes superava, agora, de muito as perdas romanas.
__ A segunda questão de honra, a perda das
águias, fora quase toda resolvida; e a maioria das águias (duas) foi recuperada.
__ Terceiro: o rebelde e taidor, Armínio, que
era cidadãos romano, fora exemplarmente punido, perdera quase todo o seu
exército e tornara-se um chefe desacreditado entre os seus. Não oferecia mais
perigo a Roma.
__ Quarto: a Germania é imprevisível até no
clima! Por duas vezes os romanos estiveram perto de uma grande catástrofe. Até
quando conseguiriam driblar a natureza e a meteorologia surpreendente daquela
região, que os romanos, mediterrâneos, tanto temiam e evitavam?
__ Quinto: não havia como evitar a
transferência de cultura e tecnologia de todos os tipos para a Germânia,
inclusive a militar, e Armínio era um exemplo, por causa da interação entre as
culturas, que tornariam suas tribos cada vez mais difíceis de serem derrotadas,
como Teutobrugo e essa campanha mesma haviam demonstrado. As campanhas tenderiam
a ser sempre mais onerosas e difíceis em todos os sentidos.
__ Sexto: a Germânia era uma região
inóspita e cheia de florestas, onde povos tribais, ciosos de seus costumes e
liberdade, podiam se ocultar, enquanto submetiam as legiões a uma guerrilha
interminável. O que havia para além? Apenas as planícies da Polônia e da
Rússia, das quais os romanos, sem uma população autóctone amigável, só poderiam
colher resfriado. De uma certa forma os romanos já forçavam muito a si próprios
investindo tantos recursos na manutenção da Britânia, porque arranjar mais um
escoadouro de recursos, por uma terra que não tinha, naquela época, nehuma
riqueza substancial à vista, um comércio próspero, etc. Definitivamente não
fazia mais sentido manter aquelas operações.
__ Sétimo: o próprio Otaviano Augusto
determinara em testamento que o Reno deveria ser a fornteira natural entre o
mundo romano e os povos da Germânia.
__ A política romana para região foi,
portanto, consolidada por Tibério: não ocupar território a leste do Reno,
deixando esses povos entregues à sua sorte; fazer alianças ora provisórias ora
permanentes com alguns grupos, em vista aos interesses estratégicos romanos na
região, aproveitando do ardor guerreiro dos germânicos para jogar um grupo
contra o outro indefinidamente, sem gastar muito dinheiro com isso.
__ E, acima de tudo, Tibério aspirava
manter um general em ascensão longe de Roma e de seu trono. Germânico tinha ‘tudo’
contra si. Era uma general muito competente, um gênio militar de primeira
grandeza, com uma capacidade de liderança e motivação formidável sobre seus comandados, além de ser
uma pessoa de trato fácil e gentil, que encantou as massas de Roma, durante o
seu desfile triunfal. Exatamente o oposto de Tibério, um homem reservado, enrustido,
que alimentava um sentimento desconfiança doentio contra tudo e contra todos,
de trato muito desagradável. A atmosfera ficava “pesada” ao seu redor. A última
coisa que Tibério queria era um Julio Cesar, turbinado pela Germania, junto a
ele, e até na Europa, por isso mandou-o para uma das Sibérias do império
romano: ao Oriente, à Síria, para difíceis missões junto aos soberanos locais,
com um espião e amigo sua inteira confiança, Cneu Calpurnio Pisão, num posto
superior, para ficar na cola do incauto desafeto.
__ As desavenças entre Germânico e Pisão
foram inevitáveis, pelas medidas desmoralizantes que este tomava contra aquele,
que resolveu largar a Síria e retornar à Roma. Entretanto, mal expôs seu
projeto caiu doente, em Antioquia, capital da Síria, e no dia 10 de outubro de
19 morreu em meio a terríveis sofrimentos, não sem antes expressar a crença de
que tinha sido envenenando por Pisão e pedir à sua mulher, em testamento, que
vingasse a sua morte. A notícia disso causou sensação em Roma e um movimento
furioso de identificar e punir os responsáveis começa a subir os escalões do
poder até chegar em Tibério – este não participara da cerimônia fúnebre a
Germânico nem proferirá uma só palavra a respeito de sua morte. Nas ruas o povo
começa a se amotinar. As tropas ficam inquietas.
__ Tiberio toma a iniciativa rápida de
entregar Pisão ao julgamento no Senado e não toma a sua defesa, deixa-o entegue
aos senadores, e este, percebendo que a sua pena era inexorável comete suicídio
ou foi “suicidado” por alguém na prisão – fala-se na participação de laguém
próximo a Tibério. No final, assim como o nebuloso assassinato do presidente americano
John Kennedy, nada ficou definitivamente provado. Embora para o grande público
Tibério passe para a história como o mandante e o principal interessado na
morte de Germânico.
O
preço da derrota
__ Armínio terminou a campanha de 16
encurralado. Deve ter se sentido solitário, nesse momento! Teutobrugo prometia
um prestígio militar, uma vitória espetacular sobre o maior império do mundo,
e, quem sabe, até que o início de um império querusco, englobando uma federação
de povos, sobre a Germania, capaz de
negociar com Roma de igual para igual. Já imaginaram, devia pensar ele, a garra
e a força dos germânicos aliadas às técnicas militares aprendidas dos romanos!
__ Convenhamos: Armíno foi ingênuo e não
percebeu que a principal força de Roma não estava nas armas incríveis, na
disciplina tática, no número de seus soldados mas em toda uma estrutura previa,
anterior, tanto econômica como ideológica, que tornava possível um exército
gigantesco, coeso e motivado. No plano econômico os germânicos jamais poderiam
criar recursos que lhes permiotissem contrapor a Roma forças esquivalentes, sem
uma profunda reforma de seus costumes e tradições, que eram, justamente, o que
eles mais queriam conservar! Tampouco os germânicos conseguiriam algo relevante
nesse sentido se não conseguissem superar a mentalidade tribal por outra que os
unissem como causa comum, da mesma forma que Roma unia seus generais, soldados,
povo e aliados em torno do ideal de uma cidade viva, uma deusa, uma mãe nutriz,
à qual se devia lealdade ao preço da própria vida.
__ Não que os germânicos não fossem capazes
de dar a vida por uma causa, e bem que o davam, e até com muita frequência, só para
encher o saco ou descorçoar outro germânico a quem roubara algo ou matava, em
infindáveis acertos de contas e razias familiares. Essa era a liberdade tribal
que eles gozavam e queriam manter, e foi em nome delas que Armínio começou toda
essa guerra que no final deveria presentiar os germânicos justo com aquilo que
eles não queriam: a perda da liberdade tribal e dos costumes antigos. O que
Arminio propunha era sacudir o jugo romano para os germânicos incorporarem o
jugo dele próprio e de seu povo. Ao invés de terem um chefe, numa numa cidade
esquisita, a milhares de quilômetros de suas terras, os germânicos passariam a
ter um chefe local a dizer-lhes o que seria melhor fazer, justo por ter
aprendido com o inimigo a como fazer isso. Creio que alguns germânicos começaram
a pensar que estavam trocando seis por meia dúzia.
__ Armínio, entretanto, continuava a alimentar
a ideia de uma aliança de povos, e continuava a sua pregação por uma federação
germânica – já dera a mulher e um filho pela causa – principalmente entre os
chefes do seu povo e aqueles que lhe eram mais próximos, e ainda conseguiu,
entre os anos 17 e 18, vencer com sua gente o poderoso reino germânico dos
marcomanos, cujo rei foi obrigado a pedir asilo em Roma – os romanos não o
ajudaram, porque na campanha de 14-16 ele preferiu ficar neutro, e não deu
ajuda aos romanos. Mas foi justamente nas mãos de parentes proximos que
encontrou a morte de maneira misteriosa, provavelemtne envenenado, no mesmo ano
que Germânico.
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__
Os legionários da fronteira com a Germânia, algumas das tropas mais duras e bem
preparadas do exército romano, tinham uma alegria especial: as traquinagens de
seu mascote, um garotinho de três anos chamado Caio Julio Cesar Germânico, o
filho de seu querido comandante, Germânico Julio Cesar, que passeava entre
eles, vestido de legionário, com uma caliga, bota militar, adaptada, parecendo
um soldadinho de verdade. Era a alegria dos soldados e o orgulho do papai, que
imaginava estar assim preparando o menino para a dura vida militar, que era o
mínimo que se esperava de um bom cidadão romano, bem como de um pretenso
herdeiro ao posto de comando do império. Os legionários o chamavam de
“calígula”: “botinha”.
__ Esse garoto, porém, seja pela violência
e pelo estresse que viveu nas campanhas militares ou pela convivência pacífica,
mas doentia e cheia de perigos, com os poderosos de Roma, sem falar do fim
trágido de seu pai, ou fosse ainda por causa de uma doença estrutural, uma
psicose – alguns imaginam a esquizofrenia – ou como sequela de uma doença
gravíssima que o acometeu em 37, e da qual quase não escapou vivo, tornou-se,
com o passar do tempo, um psicopata, um monstro de depravação e crueldade, e também
governante máximo do Império Romano, sucedendo a Tibério, a partir de 18 de
março de 37.
http://www.ancient-origins.net/sites/default/files/The-assassination-of-Caligula.jpg
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__ Em 24 de janeiro de 41, enquanto se
dirigia ao Fórum de Roma, para a habitual reunião do Senado e audiências
diversas, o jovem imperador Calígula, ou Botinha, andava despreocupado entre
cortesões e guarda costas; certamente pensava nas últimas perversões que havia
praticado com seus áulicos e, quem sabe, imaginando outras ainda mais perversas
e degradantes para aquele dia, quando de repente sente uma dor intensa e
profunda no abdômen. Ele sai de seus pensamentos e vê, à sua frente, a Cassio
Querea, um dos mais elevados oficiais da Guarda Pretoriana, e, até ali, o seu
“saco de pancadas”. Quereas tinha um punhal ensanguentado nas mãos. Botinha,
horrorizado, descobre, segurando o lugar onde doía, que é o seu sangue, que
fora ferido, e antes que pudesse esboçar qualquer gesto de defesa ou mesmo
gritar de dor e de medo ante o desenlace que se avizinhava, sentiu uma série de
pontadas e dores excruciantes apor todo o seu corpo, conforme os punhais e
adagas de outros guarda pretorianos e conspiradores lhe penetravam até perder
definitivamente os sentidos e cair no chão, sobre uma poça de sangue, num fim
infame de um homem infame, filho de um dos maiores generais de Roma...
__ Na casa de uma ricaça italiana uma
senhora germânica escrava, de cabelos louros embranquiçados, preparava
cuidadosamente o toucador de sua senhora, enquanto se informava sobre as últimas
notícias, que a ama falava sem parar, mostrando grande nervosismo: “Que
absurdo, mataram o imperador!... tenho que me preparar para as exéquias... que
amolação, logo hoje!... mas que mundo é esse? ??? Tire esse sorriso idiota da
boca!...”
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__ Poucos dias depois, num forte da
fronteira do Reno, um grupo de cavaleiros germânicos se aproxima da paliçada e
comunica algo à sentinela. Um soldado vai até o centurião no comando, que
naquele momento se aquecia em frente a um fogo dentro de um aposento. “Alguns
bárbaros estão aí e querer falar-lhe”. O centurião pragueja e pronuncia um
monte de maldições, enquanto veste um grosso agasalho de pele de urso, e coloca
o elmo com um vistoso penacho, antes de sair da casa, rumo à uma paisagem fria
e hostil, coberta de neve. Completam o quadro um céu cinzento escuro e um vento
frio penetrante...
__ Os portões se abrem e o centurião sai,
acompanhado de um grupo de soldados prontos para qualquer eventualidade. Do
alto da paliçada um grupo de arqueiros se posiciona. Um mediterrâneo típico,
ele se admira ao ver os rudes cavaleiros com roupas tão mais leves que a sua.
“São filhos de urso!” Pensou, embora fosse ele, com o seu capote, quem mais
parecia um urso.
__ “Ave” disse ele, fazendo o tradicional
gesto romano: braço direito erguido. O cavaleiro que estava à frente limitou-se
a fazer um sinal para outro e este, descendo do cavalo, foi até o centurião e
entregou-lhe algo envolvido numa pele mal curtida. O centurião recebeu aquilo,
admirado, e antes que pudesse dizer algo os cavaleiros se afastaram a toda
rédea e começaram a atravessar lentamente sobre o Reno.
__ “Veja centurião, eles cavalgam sobre o
rio congelado”, observou um soldado.
__ “É, esse ano o gelo deve ter ficado mais
grosso... Isso ainda nos vai causar problemas!”
__ Os soldados se acercaram, curiosos e
tumultuários, ao centurião que começou, cheio de desconfiança, a desamarrar os
cadarços que envolviam ao embrulho. Quando finalmente apareceu o conteúdo. Os
soldados então fizeram um profundo silêncio e lágrimas rolaram pelo rosto do
centurião...
__ Era a águia que ainda faltava das
legiões exterminadas em Teutoburgo...
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Fonte principal: Spedizione germanica di Germanico - Wikipedia em italiano.
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