quinta-feira, 31 de maio de 2018


A MALDIÇÃO DA REPÚBLICA

Prof Eduardo Simões

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1889

__ É curioso o quanto o Brasil, e a América Latina em geral, só consegue estabilidade e um bom crescimento durante regimes autoritários. Fora isso reina a instabilidade política e a romaria de desgraças a ela associada: a violência, miséria, oportunismo, etc. No nosso caso em particular parece haver uma forte relação entre essa tendência tão nefasta e o regime republicano.
__ Digo isso com pesar, porque sou um republicano desde que me conheço, mas não hesitaria em sacrificar essa minha convicção se me convencesse que isso seria o melhor para o país, em função das disposições culturais-psicológicas de nosso povo, a precisar sempre de referenciais concretos ou imagens paternas fortes como modelo de ação. A história explica, mas quem sabe História do Brasil nos dias de hoje? Agradeçam ao modelo educacional vigente.
__ Quando destituímos o segundo imperador, o homem que fez o governo mais longo e estável do Brasil, seguindo em parte as pegadas de um ascendente autoritário e profícuo: o rei português João VI, em 1889, a liderança republicana teve o bom senso de preservar a estrutura autoritária, burocrática, e elitista do governo anterior, ao longo de toda “República Velha” (1889-1930), estabelecendo a fase republicana mais estável desses 129 anos de república, em que pese muitos conflitos sociais graves, revoltas e motins, que não permitem equipara-lo totalmente ao 2º Reinado.
__ Quando Getúlio assume o poder, em 1930, ele busca um contato direto com o povo, eliminando os intermediários, a burocracia, mas mantendo o autoritarismo e o pulso forte, que fizera a fama do 2º presidente: Floriano Peixoto, idolatrado, por isso, pelas massas cariocas. Mas a eliminação renitente da burocracia, e a incapacidade de reestruturação do varguismo, gerou uma fragilidade estrutural no sistema que levará inevitavelmente à crise de 1946, e ao modelo democrático importado da República Populista, com burocracia, mas sem autoridade, em virtude do horizontalismo alienígena made in USA, até o dramática crise de 1964, onde desponta a mais feroz de todos os regimes, o Militar, que recuperou a autoridade e o elitismo, mas transformou a burocracia numa piada, favorecendo à corrupção. Com a volta da democracia, via Nova República, nos vemos às voltas com uma burocracia escangalhada, um horizontalismo confuso, presente nas eleições diretas à presidente, e uma autoridade difusa, mais próxima do partido e das lideranças sindicais que do governante, uma jaboticaba brasileira.
__ um sinal da estabilidade de uma república é a passagem do símbolo de poder, no caso a faixa presidencial, de um governante democraticamente eleito para outro, eleito da mesma forma. Vejamos como isso se deu na república brasileira, a partir de 1926:
1926 – Washington Luiz recebe a faixa de seu antecessor, mas não passa ao seu sucessor porque é deposto por Vargas...
1930 – Vargas não recebe a faixa do antecessor, deposto, e não passa ao seu sucessor por ser deposto em 1946.
1946 – Dutra não recebe a faixa do antecessor, deposto, mas a passa ao sucessor: Getulio Vargas
1954 – Café Filho assume, uma vez que Getúlio se suicida, nem a passa ao seguinte, por ser deposto em um ano em que o Brasil teve três presidentes.
1956 – Juscelino não recebe a faixa do antecessor, mas a transmite ao sucessor: Janio Quadros.
1961 – Janio renuncia pouco tempo após assumir, e não passa a faixa ao sucessor
1961 – João Goulart assume, por ser vice, e é deposto em 1964,
1964 – o Gal Castelo Branco assume, sem receber a faixa do antecessor, mas a transmite ao sucessor.
1967 – o Gal Costa e Silva recebe a faixa do antecessor, mas morre no meio do mandato, em circunstâncias misteriosas.
1969 – Assume o poder uma junta militar espúria e ilegal, de acordo com a Constituição de 67, feita pelos militares!
1970 – Assume o Gal Medici, que não recebe a faixa do antecessor, mas passa ao sucessor.
1974 – Assume o Gal Geisel, que recebe a faixa e a transmite ao sucessor
1979 – Assume o Gal Figueiredo, que recebe a faixa do antecessor, mas se retira de Brasilia uma hora antes da posse de seu sucessor, e não lhe transmite a faixa.
1985 – Assume Tancredo Neves, que não recebe a faixa do antecessor nem a transmite.
1985 – José Sarney assume, por ser vice, com a morte de Tancredo.
1990 – Collor de Mello assume, não recebe a faixa do antecessor, morto, e ainda sofre impedimento pelo Congresso no meio do mandato.
1992 – Itamar Franco assume, em receber a faixa do antecessor, mas a transmite ao sucessor.
1995 – Assume FHC, que não recebe a faixa do antecessor, impedido, e a transmite ao sucessor
2003 – Assume Lula, que recebe a faixa do sucessor e a transmite à sucessora.
2011 – Assume Dilma Rousseff, que recebe a faixa do antecessor, mas sofre impedimento pelo Congresso.
2016 – Michel Temer assume, enquanto vice.
__ Tomando como base o ano de 1930, temos então 88 anos de crise política quase contínua, e pela primeira vez percebemos que essas crises estão começando a afetar seriamente a economia, o que não acontecia no passado; ou seja, estão ficando mais graves. É possível um regime ser minimamente viável após gerar um ciclo de crises políticas de 88 anos? Não estará na hora de pensar seriamente sobre isso?
__ O momento presente nos dá esperanças em prol da República Brasileira? Infelizmente não: a atual Constituição, a sétima da República (!), com apenas 30 anos, está destroçada por mais de 100 emendas, além de 147 projetos de emendas esperando a sua vez no Congresso! Não é possível, acabou-se, acabou-se! Que dizer da disposição do povo nas ruas? À esquerda, grupos fornidos ajuntam-se para tornar um líder corrupto e populista inalcançável pela lei, sem falar da atuação agressiva na greve dos caminhoneiros que quase colapsa todo país, enquanto à direita grupos fornidos fazem apelos melodramáticos para que os militares deem um novo golpe na democracia cambaleante, caso único no mundo atual (!); à margem, grupos de traficantes e milicianos começam a construir enclaves territoriais dentro das grandes cidades, com o amplo apoio de setores a população mais pobre e até mediana; embriões de futuros países?
__ Creio que ao Brasil restam duas alternativas, na verdade só uma, a volta da monarquia, e a outra seria a divisão em vários países diferentes de língua portuguesa; mas aí já é outra história. 

Álbum da interminável crise republicana

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