segunda-feira, 20 de julho de 2015

JUSTO O CONTRÁRIO! OU O DESERTO DA NOSSA EDUCAÇÃO – 11

Prof Eduardo Simões


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         Curioso costume finlandês e sueco. As pessoas que colam grau de Doutor, nas universidades, recebem, além do diploma, uma cartola e uma espada de verdade, com as quais desfilam pelas ruas das cidades, em determinadas ocasiões, quando são muito reverenciados. Esse costume, inclusive é mais velho que o Brasil português. Lá eles não são chamados de “doutorzinho..."

         Dava gosto ver a professora de português, Elvira, discorrer sobre suas aulas no mestrado da USP! O quão apaixonante eram os temas, o frisson de encontrar pelos corredores grandes nomes da literatura nacional, a até estrangeira, o ambiente de seriedade e a profundidade dos estudos etc.
Como amigo curti a euforia dela, e por um momento até me senti mordido pela inveja, mas não pude evitar chama-la ao lado e dá-lhe um alerta. Disse-lhe que aproveitasse ao máximo o tempo de mestrado, mas que não esquecesse que um dia, inclusive por força de contrato, teria que voltar à sala de aula, para lidar com alunos desmotivados e semianalfabetos, que são a principal responsabilidade dela, e de todos nós professores. Depois que eu falei ela ficou me olhando, como se tivesse levado uma cacetada na cabeça, pode até estar me odiando, por eu ter cortado o seu barato, mas não disse nada, pois sabia que eu estava com a razão. Ela posteriormente voltou, justo quando a escola começou a ganhar fama de muito problemática. O mestrado não foi suficiente para lhe salvar do caos, embora tenha elevado o seu salário.
Eu acho que nós até pudemos até contrariar uma autoridade que gostaria de apresentar-nos como insignes “mestres” e “doutores” em sala de aula, como se isso, por si só, melhorasse a qualidade da educação, mas não podemos nunca falhar com nossos alunos, mesmo pertencendo a uma sociedade que não dá a mínima para eles, para as suas crianças; e quem já ministrou aulas sabe o quão poderoso pode ser um sentimento de frustração quando um professor prepara uma “super aula”, que ele tem certeza que os alunos vão curtir, pois ele não falará senão do óbvio e o assunto muito interessante, e na hora de por aquilo em prática, os alunos agirem como se você estivesse falando grego.
É nesse contexto de frustração recíproca, que ocorrem os piores conflitos entre professor e aluno. O impulso que nos obceca, a nós professores, é desancá-los ali mesmo, danem-se os bons modos, e só a muito custo conseguimos nos livrar disso, relatando o episódio a nossos colegas durante o recreio ou após as aulas, os que conseguem segurar até lá... um conhecido, professor de matemática, colega da profa Elvira (acima), com mestrado, doutorado, e viagens à Europa, Ásia, além de ser também professor universitário – mais perfeito para o sistema impossível – não conseguiu lidar com isso, e avançou nas críticas ao desinteresse e ignorância de seus alunos, um deles reagiu, arremessando-lhe um ovo; a direção, como é muito comum, lavou as mãos, e ao chegar em casa ele teve um AVC.
Eu jamais poderia esperar que meus alunos de Ensino Médio não tivessem a menor ideia de quem eram Chico Buarque de Holanda, Gilberto Gil – uns já tinham “ouvido falar” em Caetano Veloso. Certa vez, falando do compositor alemão Ludwig Beethoven, uma aluna acrescentou: “então ele é um compositor, eu pensei que fosse um cachorro!” Ou que um aluno iria me perguntar o que é “agricultura”? A turma que aceitou a hipótese da descoberta do Brasil, pelos portugueses, ter acontecido em 1984! etc. etc. etc. Todos esses casos, sem exceção, aconteceram em turmas do Ensino Médio!
Pode-se até argumentar que a obrigatoriedade do mestrado existe na Finlândia ou em outros países desenvolvidos, mas não se deve ignorar que esses cursos, lá, aprofundam ou criticam projetos educacionais antigos, estáveis, claros, que de alguma forma funcionam e trazem progresso e qualidade de vida para a sociedade, etc., ao contrário do que ocorre aqui, onde uma Lei de Diretrizes e Bases frouxa, alheada da sociedade, escorada por PCNs que não passam de uma enfiada de boas intenções, vazadas em um texto genérico, repetitivo, enfadonho, por vezes ambíguo. Até parece programa de partido político local. É a ausência de direção, ou de parâmetros objetivos, que nos arrasta a esse caos educacional, que todos sabem que existem, mas que a maioria nega, pelos mais difusos e escusos interesses. Não há como dar certo!
A resposta mais comum a esse momento de perplexidade educacional que vivemos tem sido a de aprofundar, de radicalizar ainda mais, a proposta inicial, falida; até parece Danton clamando: “ousar, ousar, ousar”, até lhe cortarem a cabeça e transformarem a revolução salvadora num banho de sangue e corrupção. Estamos muito longe disso na educação?
No sertão do meu estado havia um gracejo que fazia sucesso no passado. “As coisas mais difíceis de ver no sertão são: agrônomo e comunista”, justo o que era mais necessário do ponto de vista econômico e político, da mesma forma que hoje, nas escolas, a coisa mais difícil de ver é um professor, ou mesmo aluno, universitário, fazendo pesquisa ou convivendo conosco, para saber o que acontece nas escolas, para depois poder sacar as suas fórmulas salvadoras, com um mínimo de credibilidade e efeito na realidade. Nessas condições no que poderá ser útil mestrado ou doutorado, exceto para aumento de salário, como se a nossa profissão fosse mostrar ao chefe que nós somos meninos e meninas obedientes?
Um mestrado é um complemento importante e indispensável, num sistema  ou numa sociedade que tornaram a educação o seu principal veículo de desenvolvimento, e que a entendem como uma preparação das novas gerações para os desafios presentes, e inesperados, que as aguardam, na realidade em que elas vivem. Educar é transformar a realidade pela ação, acompanhada, é óbvio, pela reflexão, mas nunca substituída por esta. Nesse momento valerá a pena fazer um mestrado, sem falar que o melhor, eu acredito que até o único, mestrado para profissionais de educação seja sobre psicologia do desenvolvimento, e afins, como sociologia das comunidades infanto-juvenis, dinâmica de grupo, por exemplo. Restringir o professor a fazer mestrado apenas em sua área técnica, para a qual ele fez concurso, é de uma inutilidade brutal, sem falar que, o professor, antes e mais do que ser um especialista em sua matéria, deve ser um especialista em crianças, jovens e adolescentes.


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         “As pérolas do ENEM” Essa é a nossa realidade mais profunda e urgente. Ninguém pode escusar-se por surpreendido, pois há 40 anos já saía, nos jornais, as famosas “pérolas do vestibular”, antigo nome do ENEM. Elas são tão numerosas e extravagantes que se tornaram roteiro de humoristas afamados, como Jô Soares, além de alimentar páginas e mais páginas na Internet, como: http://desciclopedia.org/wiki/P%C3%A9rolas_do_ENEM
http://www.perolasdoenem.com.br/

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